Nicolás Maduro, da Venezuela, e Miguel Díaz-Canel, de Cuba, comandam com mãos-de-ferro seus países, com partido único (ou de oposição controlada), caçando críticos, patrolando direitos humanos e amordaçando a imprensa. Regimes autoritários, portanto.
Ainda que se discorde da decisão do presidente eleito, Jair Bolsonaro, de desconvidar os dois líderes para sua cerimônia de posse, o critério é válido: o atropelo à democracia.
Mas, se esse é o argumento, o "desconvite" deve começar a ser escrito e enviado também para as chancelarias da China de Xi Jiang, da Rússia de Vladimir Putin, da Turquia de Recep Tayyp Erdogan, da Síria de Bashar al-Assad, do Egito de Abdul Fatah Khalil Al-Sisi, da Polônia de Mateusz Morawiecki, da Hungria de Viktor Orbán, da Nicarágua de Daniel Ortega e das Filipinas de Rodrigo Duterte.
Pelo menos nove países que ou estão sob ditaduras acusadas de massacrar sua própria população, caso do regime sírio, ou que flertam com o autoritarismo — governos de Duterte e de Ortega, para ficarmos com pelo menos um exemplo de direita e outro de esquerda.
Não citei a Arábia Saudita propositalmente porque este é um capítulo à parte. Certamente, os convites para a posse do dia 1º já foram enviados ao rei Salman al-Saud e a seu filho, o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman. O Itamaraty e o futuro chanceler, Ernesto Araújo, também irão desconvidar, baseados no argumento válido da falta de democracia, os senhores feudais da monarquia saudita, conhecidos pelo desprezo absoluto aos direitos humanos?
Salman, você sabe, é aquele príncipe moderninho, conhecido pelas iniciais MBS, que persegue a oposição, prende e mata, se necessário a quem o critica — como aliás, é suspeito de ter feito com o jornalista Jamal Khashoggi, colaborador do The Washington Post, no consulado saudita em Istambul.
Bolsonaro tem a palavra final sobre quem deseja convidar para sua posse, mesmo que a decisão de isolar Venezuela e Cuba rompa com uma tradição da diplomacia brasileira de conversar com todos — até com quem não se concorda. Mas tão importante quanto democracia é coerência.