É decepcionante que, em plena segunda década do século 21, seja preciso recuar alguns passos no tabuleiro da evolução da humanidade e ressuscitar um dos slogans mais conhecidos dos anos 1980: "Salvem as baleias!".
Desde 1982, vigora a proibição global da caça comercial desses animais, mas, a cada Conferência da Comissão Internacional Baleeira (CBI), governos como o do Japão, da Noruega e da Islândia buscam brechas legais para a retomada da matança.
Este ano, o debate ocorre em Florianópolis, tragando o Brasil para o centro da polêmica global e dando uma oportunidade de o governo brasileiro, que anda apagado em sua política externa, se posicionar de forma contundente sobre o tema, um dos mais relevantes nas discussões ambientais.
ONGs denunciam que o Japão usa de subterfúgios, como os supostos objetivos científicos, para continuar caçando baleias em suas águas territoriais e internacionais. A Humane Society International (HSI) cita um relatório segundo o qual entre 2010 e 2015, com o pretexto de coletar dados sobre o "bem estar" dos cetáceos, o país matou 482 baleias-mink. Menos da metade delas, morreu imediatamente ao serem atingidas por arpões com explosivos. As sobreviventes levaram em média cinco minutos para morrer, com grande sofrimento. Não é incomum a presença de baleeiros japoneses na costa da Antártica – dados da própria CBI mostram que 333 animais foram caçados entre novembro de 2017 e março de 2018 na região do Polo Sul. No grupo abatido, havia fêmeas grávidas e filhotes.
Pelo Artigo 8º da CBI, países podem "matar, capturar e processar baleias para pesquisa científica" — o Japão diz seguir essa norma, mas a Organização das Nações Unidas (ONU) já chamou esse argumento de "pesquisa letal".
Em Florianópolis, o governo japonês propõe um meio termo: conservar as baleias, mas também promover seu "uso sustentável", estabelecendo cotas. Afirma que a caça é uma antiga tradição cultural do país. O consumo da carne também é comum na Islândia e Noruega. Groelândia (território da Dinamarca), Rússia e Estados Unidos defendem o que chamam de "caça à baleia de subsistência aborígene" para comunidades costeiras.
Essas nações pró-caça conseguiram bloquear na terça-feira a proposta brasileira de criação de um santuário de baleias no Atlântico Sul, o que protegeria os cetáceos. Foi o primeiro round. O segundo, que pode liberar a caça, será mais duro.