O que Donald Trump quer dizer quando afirma que todas as opções estão sobre a mesa em relação à Coreia do Norte?
Seu discurso tangencia o senso comum, que até pode agradar a torcida de quem deseja apear a ditadura Kim do poder, mas tem pouca relevância no campo diplomático, onde a decisão de ir ou não à guerra não depende necessariamente apenas do presidente. Um bombardeio à Coreia do Norte, uma nação soberana e integrante da Organização das Nações Unidas (ONU), precisaria, em tese, ser autorizado pelo Conselho de Segurança. Isso, sejamos claros, não vai acontecer porque qualquer resolução nesse sentido seria vetada por China e Rússia, aliados norte-coreanos e que não querem uma guerra em seu quintal.
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Trump poderia tomar uma decisão unilateral, passando por cima da ONU e iniciando um conflito sozinho? Sim. George W. Bush fez isso no Afeganistão, em 2001, e no Iraque, em 2003. A máquina de guerra americana só se movimenta com autorização do Congresso? Em parte: depois da Guerra do Vietnã, foi aprovada uma resolução sobre os poderes do presidente, que, por 60 dias, pode agir unilateralmente e declarar guerra a outro país. Mas isso só vale em caso de emergência nacional criada por agressão contra territórios e propriedades americanas ou contra suas forças armadas. Foi passando por cima dessa regulamentação que Barack Obama abriu fogo contra a Líbia, em 2011. Os EUA não haviam sido atacados pelo ditador Muamar Kadafi.
Com ou sem uma ofensiva da Coreia do Norte, é possível imaginar que Trump conseguiria o aval do Congresso para bombardear alvos do governo comunista com facilidade uma vez que tem maioria nas duas câmaras? Também é apenas parte da verdade. Muitos congressistas do Partido Republicano, de Trump, não querem abrir um front no Extremo Oriente. Um conflito drena orçamentos e desgasta a imagem perante eleitores – a velha síndrome do Vietnã, ou, em outras palavras, a sensação de que “estamos nos metendo em uma guerra que não é nossa”.
Então, um confronto com potencial atômico é evitável? Sim. Nem a Coreia do Sul, principal rival norte-coreano, tem interesse em um conflito do outro lado de sua fronteira a curto prazo. E, principalmente, porque pode-se ter dúvidas sobre a real capacidade de os mísseis de Kim atingirem o território continental dos EUA, a Ilha de Guam ou o Havaí. Mas, com certeza, alcançam metrópoles sul-coreanas. Também o Japão, nas redondezas, está na mira dos norte-coreanos. Os EUA podem aniquilar o arsenal norte-coreano antes de qualquer míssil de Kim deixar o solo em direção aos vizinhos, imagina-se. Será? Um foguete apenas que escape ao radar americano e atinja uma cidade asiática já provocaria estragos humanitário e de infraestrutura consideráveis. O que viria depois? A derrubada do regime norte-coreano. A anexação do Norte pelo Sul capitalista. Nem China nem Rússia desejam um governo pró-americano nas suas barbas.