Por algum motivo, e você deve ter notado, as atividades culturais foram tratadas como vilãs na pandemia. Alguém inventou que elas representam um problema maior e, por isso, o setor foi excessivamente (e injustamente) penalizado nesses 14 meses de restrições, liberações, aberturas e fechamentos.
Cinema e teatro, em Porto Alegre, estão voltando somente agora – e, mesmo assim, ainda enfrentam o nariz torcido de quem acha que deveriam seguir fechados. Mas a pergunta que se impõe é: por que outros setores econômicos, que também exercem atividades consideradas "de risco", mereceram uma tolerância muito maior da sociedade e dos governos?
Um exemplo são os restaurantes. Pergunte a um infectologista o que é pior para a disseminação do vírus: um cinema aberto ou um restaurante aberto? Ele certamente dirá que é o restaurante – porque lá as pessoas tiram a máscara, comem, bebem e conversam, enquanto que no cinema, assim como no teatro, elas entram e saem de máscara, expelindo bem menos partículas de saliva no ar.
Antes que alguém bote palavras na minha boca, não estou defendendo que se fechem os restaurantes. Pelo contrário: estou dizendo que, muito mais importante do que saber QUAIS estabelecimentos deveriam fechar (cinemas, restaurantes, teatros, comércio ou museus), é saber QUANDO eles deveriam fechar. Ou seja: em que momento o governo precisa apertar as restrições às atividades econômicas.
O aprendizado dos últimos meses oferece uma resposta bem clara: as medidas mais acertadas são sempre aquelas que se baseiam nas tendências. Se os números indicam que a tendência para as próximas semanas é de agravamento da pandemia, não tem outro jeito: o governo precisa restringir – e rápido, sem hesitar – a circulação de pessoas. Sempre que demorou demais, o resultado foi trágico para o sistema de saúde.
Mas, se os números apontam uma tendência de queda na curva de contágio, ótimo, que se afrouxem logo as restrições. Foi o que ocorreu agora com os cinemas e teatros de Porto Alegre – eles já deveriam estar funcionando, mas, aparentemente, não tiveram o mesmo poder de pressão que outros setores, com associações e sindicatos mais articulados, conseguiram exercer.
Com as internações crescendo em regiões do Interior, é possível que as complicações também cheguem à Capital daqui a pouco. Mas espera-se que eventuais restrições ou liberações passem a levar em conta que, na pandemia, vilão é só o vírus.