É evidente que sou favorável à retomada gradual das atividades. Quem não é? Mas ela só pode ser gradual, só poder ser prudente e refletida, se atender a critérios técnicos – e quem dita critérios técnicos, em um momento de pandemia, são as autoridades em saúde.
Nesse projeto aprovado pela Câmara de Porto Alegre, com mais de 50 atividades listadas como "essenciais" – e, sendo essenciais, não podem ser interrompidas pela prefeitura –, não existe critério técnico. Venda de carros, por exemplo, virou atividade essencial. Bem, ela é essencial, concordo, mas para o vendedor de carro.
Imobiliárias também entraram como atividade essencial. Por quê? Ora, porque um vereador ligado ao ramo imobiliário decidiu que é essencial. Os vereadores, você sabe, foram eleitos por segmentos da sociedade – e é legítimo que eles atuem para defender esses segmentos. Mas não é legítimo que coloquem pequenos grupos à frente da sociedade inteira.
Outro vereador, por exemplo, incluiu as igrejas como serviço essencial. Por coincidência, ele é pastor evangélico. Já vereadores que representam o empresariado, adivinhe?, acrescentaram setores econômicos de seus eleitores. Não pode ser assim.
O Poder Executivo precisa ter autonomia para agir rapidamente de acordo com a evolução da epidemia: abre lá, fecha aqui, libera isso, restringe aquilo. Essas decisões – a partir de critérios técnicos, sempre técnicos – podem mudar de um dia para o outro, mas, se existe uma lei listando 50 atividades como intocáveis, essa dinâmica vai por água abaixo.
Alguém questionará os critérios técnicos do Executivo. Tudo bem, mas é inegável que ele, o Executivo, por meio da Secretaria de Saúde, apura em tempo real informações sobre os avanços e recuos da doença. E decide a partir disso. Não a partir do interesse específico do vendedor de carro.