Que coisa louca Porto Alegre fazer aniversário justamente quando não pode ser visitada, justamente quando não pode receber ninguém em lugar algum. Eu aqui, trancado em casa, percebo o quanto aquele chavão, "a gente só valoriza quando perde", faz sentido nas profundezas da quarentena.
Desde o fim de semana, me pego pensando em pontos da cidade que faziam parte da nossa paisagem diária. Nenhum lugar desses turísticos, nada de Orla nem Mercado. Locais que a gente sempre vê mas nunca olha. O viaduto da Borges, por exemplo.
Uma montanha explodida a dinamite, nos anos 1920, deu lugar à mais arrojada obra viária da história da Capital. Aquilo é único, é nosso, não existe em outro canto do mundo. Ontem senti vontade, à tardinha, de pedir uma mesa na rua, em um dos simpáticos bares que se esparramam nas escadarias do viaduto.
Lá eu acompanharia o sol se pondo e dando lugar à luz suave das luminárias antigas. Apreciaria a imponência dos parapeitos, das colunas e das arcadas em estilo eclético. E notaria o entusiasmo dos frequentadores aproveitando a cidade ao ar livre, em um ambiente com tudo – absolutamente tudo: história, arquitetura, bem-estar, segurança – o que buscamos em qualquer viagem para fora.
E tenho pensado na Redenção, em especial numa cena que também só existe lá. Na primavera, ali por setembro, os ipês floridos se refletem no espelho d'água, as pétalas cor-de-rosa forram o piso do entorno e produzem um tapete lindo. Aliás, em setembro as coisas vão estar melhores.
Quando retornarmos à normalidade, talvez a gente consiga lançar um olhar mais generoso sobre tanta coisa que, quase sempre, passa batido. Porque aqui, da janela da minha casa, no aniversário de Porto Alegre, só penso em como eu era feliz e não sabia.