Chegamos ao ponto, com o perdão do trocadilho, em que a passagem de ônibus vai custar cinco pila. Cinco reais e cinco centavos, para ser mais preciso— esse é o valor que o Conselho Municipal de Transportes Urbanos deve aprovar na reunião de sexta-feira.
Porto Alegre, hoje, já tem a tarifa mais cara do país entre as capitais: R$ 4,70. O novo recorde só confirma o quanto o sistema de transporte coletivo tem sido cruel especialmente com a população pobre. Porque, vejamos: se o cidadão ganha um salário mínimo (R$ 1.045), agora ele terá de gastar um quarto da renda mensal só com ônibus.
Isso, claro, se ele pega um ônibus para ir e outro para voltar do trabalho — se ele pega dois na ida e dois na volta, metade do salário vai morrer na catraca. A situação fica mais revoltante quando se lê na Constituição que todo brasileiro tem direito a transporte.
— Pois que andem de Uber! — alguém dirá.
Seria ótimo, mas, como a maioria dos pobres vive nas periferias, uma corrida de aplicativo, para eles, não sai por menos de R$ 40. Eu aqui, que moro na região central, chego ao trabalho de Uber pagando uma merreca. E é exatamente por isso, por pagar uma merreca, que pessoas como eu — que moram perto do Centro — cada vez mais deixam de andar de ônibus para andar de aplicativo.
Aí, o que acontece? As empresas de ônibus precisam subir o valor da passagem — afinal, com essa perda de passageiros, elas também perdem receita. O cenário, então, é o mais perverso possível: enquanto os que têm mais dinheiro migram para uma situação confortável, andando de Uber para lá e para cá, aqueles com menos dinheiro precisam gastar um quarto da própria renda para sustentar um sistema falido.
Você acha certo eles sustentarem o sistema sozinho? Acha certo eles pagarem uma passagem mais cara porque nós, que temos condições melhores, encontramos uma saída cômoda e baratinha? Não, não é certo.
Em janeiro, a prefeitura apresentou à Câmara de Vereadores uma série de projetos propondo novas fontes para financiar o transporte coletivo. Se forem aprovados, o valor da passagem cai. E uma das propostas é taxar justamente as empresas de aplicativo, o que é bem razoável: qualquer atividade comercial que utilize o espaço público — da banca de cachorro-quente à feira na pracinha — precisa pagar por isso.
— Mas as empresas vão repassar o custo para os clientes! — é o que ouço sempre.
Pois que repassem. Que deixemos de ser tão egoístas. A taxa seria de R$ 0,28 por quilômetro — em uma corrida de cinco quilômetros, pagaríamos R$ 1,40 a mais. Se isso é tão caro assim, então que voltemos a andar de ônibus.