Paulo Germano

Não tem desculpa

O blá-blá-blá das empresas de ônibus

No primeiro semestre do ano, as empresas receberam mais de 5 mil multas por atraso em suas linhas -- uma assustadora média de 28 por dia

Paulo Germano

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Em 23 de março, quando chamei de "peça de ficção" a tabela horária dos ônibus de Porto Alegre, a Associação dos Transportadores de Passageiros (ATP) lançou uma nota me contestando.

Sem qualquer autocrítica, a entidade pôs a culpa no trânsito: "As empresas reconhecem que pode haver atrasos e isso se dá principalmente pelos congestionamentos enfrentados". Segundo a nota, a implantação de faixas exclusivas para ônibus tem se mostrado insuficiente: "A maioria das viagens hoje ocorre fora dos corredores e, mesmo nos corredores, há sinaleiras e cruzamentos que prejudicam o tempo de deslocamento".

É uma boa desculpa. Queria eu poder usá-la no meu trabalho: perdão, chefe, a rua estava cheia de sinaleiras e cruzamentos. Tinha carros também, parecia uma cidade.

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Mas um levantamento da EPTC, obtido pela coluna na semana passada, confirma o quanto é intragável a justificativa: as empresas receberam, no primeiro semestre deste ano, impressionantes 5.683 multas – destas, 5.124 foram por atrasos, o que dá uma média de 28 por dia. A EPTC afirma que só aplica as multas após se certificar de que não houve imprevisto algum no trânsito.

– Sem falar que as empresas, ao final de cada dia, nos apresentam um relatório sobre possíveis problemas que possam ter enfrentado – diz o diretor-presidente da estatal, Marcelo Soletti, para depois garantir: – Essas multas, salvo uma exceção ou outra, não podem ser atribuídas a congestionamentos.

Prova de que o serviço das empresas só piora – como diz a própria EPTC em seu levantamento – é que o número de multas duplicou em comparação ao semestre anterior e triplicou em comparação aos primeiros seis meses de 2016. Quer dizer: não se trata de uma percepção equivocada dos usuários de ônibus, que, ignorantes e desinformados, mal conseguem imaginar o quanto as empresas sofrem com os horrores do trânsito porto-alegrense.

A verdade é outra: a tabela horária é uma peça de ficção.

Aliás, que maravilha de contrato deve ser esse, que nem 5 mil multas são suficientes para rescindi-lo. Dos R$ 2,4 milhões que o município teria para receber em multas aplicadas às empresas de ônibus em 2017, apenas R$ 13,9 mil foram pagos. O restante está em fase de recurso administrativo, aguardando julgamento.

Só o que não aguarda julgamento é o aumento da passagem.

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