Tão logo correu na manhã de sábado a notícia da prisão preventiva do general de quatro estrelas da reserva Walter Braga Netto, a informação passou a ser contextualizada pelo caráter extraordinário. Foi a primeira vez que um militar do Exército de tão alta patente foi detido desde a redemocratização do país. Olhando-se para o passado, são mesmo raros encarceramentos de homens que ocuparam a cúpula de qualquer uma das Forças Armadas. As circunstâncias, em casos anteriores, também foram distintas. Mas o fato histórico a ser sublinhado deve ser outro, o que aponta para o amadurecimento da democracia brasileira.
Detenção do general sem tensionamentos indica o funcionamento das instituições e a subordinação militar ao poder civil
Entre outros postos que ocupou, como ministro da Casa Civil e da Defesa no governo Jair Bolsonaro, Braga Netto foi comandante militar do Leste e chefe do Estado-Maior do Comando Militar do Oeste. Estas são posições de altíssima hierarquia na carreira castrense. Ainda assim, a sua prisão não gerou murmúrios ou manifestações de contrariedade nos meios militares, a não ser de ex-colegas de farda hoje na política, como já era o caso, aliás, do próprio Braga Netto, que concorreu a vice na chapa de Bolsonaro em busca da reeleição, em 2022.
Nenhum princípio de crise institucional se instalou. É uma resignação que só pode ser vista como inusual devido às quarteladas, períodos de tutela militar e complacências com protagonistas de rupturas que marcam a memória do país. São tempos que devem definitivamente ficar para trás.
A detenção do general Braga Netto sem tensionamentos e no âmbito de investigações sobre a tentativa de um golpe de Estado no país indica o funcionamento das instituições e a consolidação da subordinação militar ao poder civil, como em qualquer democracia hígida e firmemente estabelecida. É o império da lei.
Sobre o caso em si, as suspeitas que pesam contra Braga Netto, preso por suposta obstrução de justiça, ao tentar embaralhar investigações, são gravíssimas. O general é apontado pela Polícia Federal como figura central na urdidura de um plano para impedir a posse do presidente da República eleito em 2022, o que incluiria assassinatos. O general também teria entregado dinheiro para financiar a operação criminosa.
Braga Netto, Bolsonaro e outros 38 pessoas, em grande parte militares, já estão indiciados no inquérito da PF que investigou a tentativa de reverter na marra o resultado do pleito de 2022. A Procuradoria-Geral da República deve se manifestar sobre o caso no início de 2025. A todos os implicados deve ser garantido total direito de defesa e prerrogativas do devido processo legal.
A despeito do constrangimento causado pelas revelações às Forças Armadas, cumpre lembrar que, institucionalmente, disseram não à aventura tresloucada de uma intervenção. Mantiveram-se fieis à Constituição e à soberania popular do voto, e não a um projeto de poder, ainda que o desfecho da eleição tenha desagradado a estes mesmos que rechaçaram a sedição. Os indivíduos que tramaram e levaram adiante atos para uma ruptura, no entanto, merecem punição paradigmática, caso provem-se as responsabilidades. A depuração fará bem às Forças, que devem também, de forma terminante, se afastar da política e se fixar em sua missão profissional.