É desconcertante a sequência recente de episódios chocantes no Estado que envolvem violência, perversidades e desatinos. O noticiário dos últimos meses, semanas e dias está repleto de casos de pais que matam filhos, mães que cometem filicídio, feminicídios, parricídios, envenenamentos e outros assassinatos cruéis, como o consumado pela mulher que tirou a vida de uma grávida para roubar o bebê que ainda estava em seu ventre. Foi também perturbadora a tortura perpetrada por um patrão em um empregado, em Canoas. Os métodos e requintes de sadismo são terrificantes
Trata-se de um fenômeno difuso, que requer o envolvimento de diversas áreas do conhecimento para entender as causas
A sucessão de acontecimentos, em que estão presentes maldade, desespero e problemas de saúde mental, juntos ou não, merece uma reflexão da sociedade para buscar compreender o que está acontecendo e tratar de soluções e medidas preventivas. São muitas ocorrências estarrecedoras concentradas em pouco tempo. É temerário considerá-las apenas coincidências soturnas que não tenham uma razão de fundo.
São crimes, mas não têm relação direta com o que se convencionou chamar de criminalidade. Não são situações cujas respostas estão na ação policial, no endurecimento de legislação penal ou em uma maior rigidez da Justiça. Talvez esses pontos até façam parte das reações, junto à atenção a outras dimensões, como os já mencionados distúrbios mentais, o aperfeiçoamento da rede de proteção a públicos vulneráveis e seus protocolos e um cuidado mais acurado do sistema de justiça com desentendimentos familiares, violência doméstica e disputa por guarda de filhos.
Também devem ser incluídos neste debate a importância de uma educação voltada a combater a cultura do machismo e, outra vez, os riscos da circulação sem controle de conteúdos tóxicos em redes sociais e no submundo da internet. A série Adolescência, lançada neste mês na Netflix, alimenta essa discussão contemporânea, ao abordar o ciberbullying e como movimentos misóginos encontram no ambiente virtual terreno fértil para influenciar jovens, com consequências dramáticas. A trama, que vem chamando atenção e estimulando análises, trata do assassinato de uma menina cometido por um colega de 13 anos.
A saúde mental é um dos aspectos que merecem especial interesse. Um relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) de 2023 mostrou que o número de pessoas com sofrimentos do gênero cresce no mundo e o Brasil é o país com a maior prevalência de depressão na América Latina, quadro agravado pela dificuldade de acesso a tratamento na rede pública. Dados do Ministério da Previdência Social apontam que ansiedade e depressão levaram a mais de 470 mil afastamentos do trabalho no ano passado, número nunca visto e 68% superior a 2023. As angústias vividas ao longo da pandemia estão entre as causas apontadas. No Rio Grande do Sul, mostram outras pesquisas, há ainda o estresse pós-traumático das enchentes.
Trata-se de um fenômeno difuso, que requer o envolvimento de diversas áreas do conhecimento para entender as causas e tratar de ações para frear essa onda de atrocidades. Ser complexo não significa não ter solução. Como exemplo podem ser citadas as medidas que contiveram o surto de ataques a escolas no país entre 2022 e 2023.