Um dos grandes méritos da Operação Leite Compen$ado, deflagrada pela primeira vez em 2014, foi fazer o setor se comprometer a aperfeiçoar e manter em dia, em todos os elos da cadeia, programas de controle que assegurassem a qualidade do produto levado à mesa do consumidor. A última fase da ofensiva do Ministério Público (MP) contra fraudadores de um dos mais nobres alimentos ocorreu em 2017. Imaginava-se que as sanções aos envolvidos, com condenações, prisões e R$ 12 milhões em valores pagos pelos investigados, seriam pedagógicas. E crimes semelhantes não voltariam a ocorrer no Estado tão cedo.
Gera mais indignação o fato de entre os presos estar um engenheiro químico implicado outras duas vezes na adulteração de leite
Causa revolta que ainda existam empresários do segmento e profissionais gananciosos, crentes na impunidade, dispostos a lucrar a qualquer custo, o que inclui fraudar com substâncias nocivas à saúde um alimento básico, consumido em larga escala por crianças, por exemplo. Foi o que descobriu o MP, a partir das investigações que resultaram na 13ª etapa da Operação Leite Compen$ado, deflagrada nesta quarta-feira. Um laticínio de Taquara, no Vale do Paranhana, foi o alvo. Cinco pessoas acabaram presas. Entre elas, um sócio da empresa.
Gera mais indignação o fato de entre os presos estar um engenheiro químico, conhecido como "Alquimista", implicado outras duas vezes na adulteração de leite. Uma delas foi em 2005. Acabou absolvido. A outra foi na quinta fase da operação, em 2014. O engenheiro ainda espera o desfecho do processo judicial sobre este caso, mas estava proibido de trabalhar em laticínios e há dois anos deveria estar usando tornozeleira eletrônica. Segundo o MP, o profissional foi contratado para orientar sobre a adição de soda cáustica e água oxigenada para mascarar a deterioração dos produtos. As irregularidades foram encontradas no leite UHT, no em pó, no soro e em compostos lácteos.
Todos os investigados devem ter total direito à defesa. Mas o mínimo a se aguardar é uma apuração profunda sobre esse caso e a aceleração do processo em curso a que o engenheiro responde. Uma vez provados na Justiça os crimes, o que a sociedade espera é uma punição adequada e que impeça definitivamente os envolvidos de voltarem a delinquir. De acordo com o MP, além de ter marcas no varejo, a companhia vendia para prefeituras e há pouco venceu licitação para fornecer a uma escola em São Paulo. Uma empresa investigada por não ter integridade em seus produtos, portanto, ganhou um contrato público para nutrir crianças.
O promotor Mauro Rockenbach, da Promotoria de Justiça Especializada Criminal de Porto Alegre, lembra que, após 2017, chegaram ao MP apenas duas denúncias. Envolviam adição de pequena quantidade de água no leite. Entendeu-se que não existiria necessidade de novas operações. Foram feitas recomendações para ajustes nos procedimentos. O caso de agora, pelo contrário, é grave. É provável, portanto, tratar-se de episódio isolado, e que não deve gerar temor no consumidor ou manchar a imagem da cadeia, como em 2014. Todo o segmento no Estado, inclusive quem não tinha nenhuma relação com qualquer adulteração, teve prejuízos com a fraude cometida por uma minoria uma década atrás. O aprendizado, porém, legou um sistema de controle de qualidade mais robusto e benéfico para a população.