O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) deu um duro recado aos incautos. Além de elevar a Selic em um ponto percentual, subindo o juro básico para o patamar de 12,25% ao ano, prescreveu mais duas altas da mesma magnitude nas próximas reuniões. O choque monetário que elevaria a taxa para estratosféricos 14,25% pode até ser necessário, dada a desancoragem das expectativas para a inflação e a leniência com a fragilidade fiscal do país. Mas cria o risco de um efeito colateral acentuado com um brutal encarecimento do crédito, o desincentivo aos investimentos produtivos e um freio brusco na economia, hoje bastante aquecida. E assim segue um país, como um cão em círculos tentando morder a própria cauda.
Uma esperança seria um surto de sensatez do governo federal e do Congresso ante os desafios domésticos
Na linguagem própria do Copom, uma fresta ficou aberta. O comunicado divulgado junto à decisão de quarta-feira indica que a elevação da Selic será de mais dois pontos percentuais "em se confirmando o cenário esperado". Em relação às incertezas externas, nada há para se fazer. Uma esperança, portanto, seria um surto de sensatez do governo federal e do Congresso ante os desafios domésticos.
O choque de juro deveria ser também um choque de realidade. O Executivo, idealmente, se renderia aos fatos e acenaria com mais medidas para um ajuste estrutural nas contas, capaz não apenas de garantir o cumprimento do arcabouço fiscal até 2026, mas de estabilizar a dívida pública nos anos seguintes.
Do parlamento, se esperaria que separasse os interesses próprios dos do Brasil. O pacote enviado pelo Planalto ao Legislativo pode ser insuficiente, mas a deterioração dos indicadores financeiros, com impacto na economia real, será muito mais séria se o mesmo não for aprovado com os aperfeiçoamentos possíveis. Deputados e senadores, porém, demonstram pouca preocupação com o quadro alarmante. Seguem com a política da faca no pescoço do governo, travando a votação do ajuste devido ao impasse no pagamento de emendas. Para os congressistas, a prioridade são eles próprios e suas conveniências.
Além de chantageado, o Planalto mostra-se aturdido, incapaz de negociações produtivas com o Legislativo. Outra consequência da desarticulação foi o avanço de pautas esdrúxulas no parlamento, como voto impresso e liberação de armas para pessoas investigadas criminalmente. A situação piora com a ausência de Lula para tratar de problemas de saúde. Em uma atitude ajuizada, o presidente da Câmara, Arthur Lira, decidiu nesta quinta-feira cancelar as sessões de comissões até o fim do ano para centrar atenção na votação dos temas econômicos no plenário
Os sinais inquietantes estão aí: dólar na casa dos R$ 6, inflação em 12 meses em 4,87%, acima do limite de tolerância, e disparada dos juros futuros. Diante de tamanho atordoamento, sem sinal crível de reorganização política em torno das prioridades reais e com a política fiscal remando na direção oposta, restou ao BC ser mais conservador e reforçar a mensagem de compromisso em levar a inflação a convergir para a meta. Mesmo que o custo seja caro para a economia real nos próximos trimestres.