São cada vez mais abundantes os sinais de que facções criminosas estão buscando interferir em eleições e se infiltrar no poder público para assegurar influência e vantagens para lavar dinheiro oriundo de suas atividades ilícitas. Ainda que o caso deva ser tratado com a devida cautela, a Operação Confraria, deflagrada em Parobé na semana passada pelo Ministério Público e pela Polícia Civil, com mandados de busca cumpridos na prefeitura e na própria casa do prefeito, traz suspeitas seriíssimas de relações promíscuas entre agentes políticos e a delinquência organizada. Impedir esse tipo de cooptação é um desafio a mais no combate a essas megaquadrilhas.
Cabe às instituições que investigam facções redobrar a atenção para identificar e coibir com rigor a contaminação do aparato estatal
As investigações apontam que uma facção negociou apoio ao grupo que chegou ao poder em troca de contratos de serviços públicos, obtidos supostamente por licitações direcionadas, no valor de R$ 40 milhões. As empresas de fachada montadas para vencer as concorrências serviriam para lavar dinheiro. Um membro de facção, com cargo em comissão no alto escalão do Executivo, estaria ameaçando oposicionistas e críticos da administração.
O mais grave é que tudo indica não se tratar de um caso isolado. Em entrevista ao Gaúcha Atualidade, da Rádio Gaúcha, no último dia 18 deste mês o procurador-geral do Ministério Público (MP) do Rio Grande do Sul, Alexandre Saltz, confirmou ser uma situação recorrente. Referiu ainda a procura das facções para se imiscuir no processo eleitoral. Em relação a administrações públicas, mencionou um crescimento da participação desses grupos criminosos em contratos com municípios.
Episódios ocorridos no pleito municipal deste ano no Estado ilustram como esses grupos agem. No final de setembro, Polícia Federal (PF) e Polícia Civil fizeram uma operação em Bagé contra uma organização que estaria interferindo na eleição local e dando suporte a uma vereadora. O grupo estaria por trás de um ataque a tiros durante um comício e da invasão à residência de um candidato à Câmara. Outra investida policial, no início de outubro, tentou interromper a influência de uma facção ligada ao tráfico de drogas no Legislativo em São Borja. A quadrilha dava apoio material e financeiro a um postulante à vereança.
O caso mais perturbador a demonstrar o grau de infiltração de quadrilhas nos serviços públicos é o do transporte urbano na cidade de São Paulo. No início do ano, descobriu-se que duas grandes empresas de ônibus, que juntas operam mais de 1,3 mil veículos, na verdade pertenciam ao PCC, maior facção do país. Na semana passada, a PF e o MP de São Paulo prenderam quatro policiais civis, um deles delegado, por ligação com esse mesmo grupo.
O fato é que, nas grandes metrópoles ou nos pequenos municípios, organizações criminosas avançam, tentando eleger candidatos e esquentar dinheiro originário de outros crimes prestando até serviços básicos aos cidadãos. É mais um exemplo da sofisticação e da capacidade adaptativa do submundo na tentativa de diversificar atividades e encontrar maneiras de encobrir a origem ilícita de recursos. Cabe às instituições que investigam a atuação das facções redobrar a atenção para identificar e coibir com rigor a contaminação do aparato estatal e o aliciamento de agentes públicos ou políticos.