De vez em quando aprendo uma palavra nova da língua italiana por conta de citações espontâneas de minha mulher, que nasceu entre os oriundi lá das bandas de São Domingos do Sul, belo município encravado na encosta superior do Nordeste deste Estado. Falávamos de política e ela lascou essa:
– É a medesima coisa!
Medésima, como assim? – perguntei, antecipando-me à tradução com uma tentativa de gracejo:
– Parece nome de bruxa. Cala a boca guri, senão eu chamo a Medésima! E aí a Medésima lançou um feitiço e transformou a menininha numa borboleta!
Ô imaginação! Ela logo interrompeu o meu devaneio para explicar que se tratava simplesmente da palavra "mesma". E, especialista que é em palavras cruzadas, me lembrou que a língua portuguesa também tem os seus termos estranhos. Tive que concordar, reavaliando a mesma frase. "Coisa", por exemplo, talvez seja até mais esquisita do que "medésima". Aquela, sim, é uma palavra de múltiplos significados. Serve para tudo. É a muleta do nosso idioma. Faltou uma palavra, usa-se coisa para expressar qualquer pensamento.
– Olha que coisa mais linda, mais cheia de graça...
– Fulano sabe das coisas...
– Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa...
Sinônimo de um monte de coisas, inclusive de coisas indizíveis, a palavrinha pode ser substantivo, adjetivo, advérbio e até ser conjugada como verbo nas acepções coisar ou coisificar, aceitas no Brasil e em Portugal. Temos coisa boa e coisa ruim para usar a toda hora e em qualquer situação. O recurso serve até para preencher aqueles vazios do esquecimento:
– Chama aí o seu Coisa para consertar o carro...
– Mãe, a dona Coisa tá aí...
Confesso que, às vezes, o uso generalizado da palavra me incomoda. Detesto, por exemplo, aquelas chamadinhas caça-cliques tipo "10 coisas que você precisa saber". Coisa mais sem graça. Em contrapartida, gostava quando Raul Seixas cantava coisas do coração ou quando Chico Buarque fazia a banda passar cantando coisas de amor.
Mas coisa também tem o seu lado sombrio, tanto que a palavrinha já deu nome a mais de um filme de terror. Coisa de outro mundo é uma expressão de espanto, embora possa também significar algo bonito e extraordinário. Bom, chega de divagações. Antes que me acusem de não estar dizendo coisa com coisa, quero voltar à questão política que deu origem a este texto: a próxima eleição.
Ao que tudo indica, será mesmo a medesima coisa. Ô gente de pouca imaginação!