Antes que a divergência de interpretação do Hino Rio-Grandense se transforme numa nova Revolução Farroupilha, ofereço minha simplória proposta de tratado de Poncho Verde na tentativa de evitar mortos e feridos — especialmente no campo das batalhas virtuais, que é onde se travam os embates modernos.
Por que não alterar o verso que causa desconforto a uma parcela da população? Acho que nem o maestro Mendanha nem o Chiquinho da Vovó vão se importar, pois ambos, autores respectivamente da música e da letra, já passaram para aquela dimensão em que os conflitos humanos deixam de fazer sentido.
Pessoalmente, acho o nosso hino um pouquinho pretensioso naquela parte que fala de as nossas façanhas servirem de modelo a toda terra (ou a toda a Terra, nunca entendi bem a intenção do autor). No restante, porém, é bem aceitável, talvez agora com a exceção desta parte que está causando controvérsia.
Confesso que me emociono quando ouço o Neto Fagundes ou outro dos nossos gaudérios afinados soltando a voz para comparar o 20 de Setembro à aurora precursora do farol da divindade. Pura poesia. Nosso hino tem lirismo e sonoridade, clama pela liberdade e enaltece a bravura, sem glamorizar a crueldade ou pregar extermínio e superioridade racial, como fazem algumas canções nacionalistas inspiradas no belicismo.
Como já foi alterado outras vezes ao longo de sua história, não custa adaptá-lo a esses novos e sensíveis tempos que estamos vivendo. A última mudança é relativamente recente. Há exatos 55 anos, quando foi oficializado como Hino Rio-Grandense pela lei 5.213 de 5 de janeiro de 1966, perdeu uma estrofe inteira:
“Entre nós, reviva Atenas
para assombro dos tiranos;
Sejamos gregos na Glória,
e na virtude, romanos”.
Pois se já não ambicionamos ser gregos ou romanos (suspeita-se que os donos do poder implicaram com a rima), que sejamos pelo menos civilizados e tolerantes neste debate. Tenho certeza de que não faltarão sugestões criativas para a mudança dos versos que causam incômodo e constrangimento. Eu, que não entendo de música, gostaria de acrescentar algo como “Neste Rio Grande de todos/ não tem amo nem escravo”. Mas gostaria mesmo é que isso se tornasse cada vez mais uma verdade.