Vereadores da Câmara de Porto Alegre protestaram contra o Hino Rio-grandense na cerimônia de posse, na sexta-feira (1º), quando os parlamentares negros permaneceram sentados durante a execução, por críticas a um trecho da letra que teria conotação racista. Nesta segunda-feira (4), o Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG) se pronunciou, criticando a manifestação e defendendo que o verso em questão nada tem de discriminatório.
Ao protesto silencioso dos parlamentares, a vereadora Comandante Nádia pediu uma questão de ordem e criticou quem permanecia sentado enquanto o hino era executado. O vereador Matheus Gomes (PSOL) também solicitou questão de ordem e discursou, citando motivos para sua manifestação e a de alguns colegas.
O trecho alvo da polêmica diz que "povo que não tem virtude acaba por ser escravo". Para vereadores, versos como esse legitimam um processo de destruição da humanidade do povo negro ao afirmar, conforme os parlamentares, que "o nosso povo negro não tem virtudes, por isso foi escravizado".
Para Gomes, um dos participantes do protesto, que justificou no discurso na Câmara a sua recusa em cantá-lo, o hino do Rio Grande do Sul é racista ao falar sobre a questão da escravidão e por não reconhecer a contribuição da população negra na história do Estado. Para ele, retirar a obrigatoriedade do hino seria uma reparação histórica.
— Retirar a obrigatoriedade da execução do Hino Rio-grandense nas solenidades é um ato político antirracista. Não somos obrigados a cantar versos que legitimam um processo de destruição da humanidade do povo negro. De qual liberdade o hino fala? A briga dos Farrapos contra o Império era sobre fim dos impostos, e não questionava a escravidão. A única forma de escravidão registrada no período da guerra era sobre o povo negro. Se outras estrofes que não tinham relação com a história do RS foram retiradas, por que essa permanece? — questiona o vereador.
Gomes defende ainda que, nas "façanhas que servem de modelo a toda terra" – adaptação de outro trecho do hino –, precisa estar inclusa a contribuição negra ao Rio Grande do Sul.
— Temos história rica que precisa ser contada — reforça o vereador.
Para o MTG, falta contextualização histórica
O posicionamento do MTG partiu de Julia Graziela Azambuja dos Santos Dutra, diretora de Manifestações Individuais e Espontâneas do movimento, que é negra. Para Julia, tal afirmação no hino diz respeito a uma submissão da então Província de São Pedro ao Império, no período da Revolução Farroupilha, e a interpretação de que teria cunho racista carece de contextualização histórica.
— O MTG reconhece a importância dos negros e dos próprios Lanceiros Negros na revolução e na construção de nossa identidade regional. E tem manifestado esse respeito, inúmeras vezes, por meio das danças tradicionais. Desviar o foco dessa luta desvia o foco daquilo que deve realmente ser discutido. Enquanto a comunidade negra, na qual integrantes do próprio movimento se inserem, se prende a este tipo de polêmica, perde um precioso tempo de ser protagonista de uma nova história que cabe aos próprios negros e brancos escreverem — defende a diretora do MTG.