Não sou de chorar no cinema. Quando me emociono, como qualquer XY criado nos rigores do machismo milenar, engulo em seco e dissimulo. Além disso, até por respeito à profissão que escolhi, aprendi a reprimir manifestações públicas de entusiasmo ou decepção. Mas sou obrigado a reconhecer: The Post – A Guerra Secreta, filme dirigido por Steven Spielberg e estrelado por Meryl Streep e Tom Hanks, mexe com os instintos mais primitivos de velhos jornalistas e de profissionais que já viveram aquilo que García Márquez chamou de “palpitação sobrenatural da notícia”.
Li a autobiografia de Katharine Graham, que foi presidente e diretora do jornal The Washington Post em momentos cruciais da história recente dos Estados Unidos. Só para exemplificar: ela assumiu o comando da publicação quando seu marido se suicidou, no mesmo ano ocorreu o assassinato de seu amigo John Kennedy e coube a ela decidir os rumos do jornal no célebre episódio dos documentos secretos do Pentágono sobre a Guerra do Vietnã (tema do filme) e, posteriormente, no caso Watergate, que culminou na renúncia de Richard Nixon. Uma História Pessoal, sua autobiografia, aborda com franqueza suas decisões e hesitações em todos esses episódios.
Spielberg e seus roteiristas nem devem ter tido muito trabalho, pois o filme reproduz fielmente o relato biográfico da senhora Graham. Mas tem outros méritos, além das atuações soberbas de Meryl Streep e Tom Hanks. Um deles – talvez, o principal – é lembrar que o jornalismo existe para servir aos governados, e não aos governos. Outro, não menos importante, é valorizar o papel profissional e a personalidade da mulher numa sociedade comandada por homens. Pequeno spoiler: a mensagem subliminar da cena em que Kay (Katharine) sai do tribunal sob o olhar de admiração das mulheres já vale o filme.
Posso estar puxando a brasa para o meu assado, mas tive a impressão de que, no final da sessão em que fui, o público também saiu satisfeito com as mensagens de defesa da liberdade de imprensa, de lucidez da justiça e de afirmação da democracia. Ninguém chorou, acho que não há mesmo motivo para lágrimas. Mas os velhos jornalistas, aqueles que já viveram a “paixão insaciável” do convívio com a notícia, do matraquear das máquinas de escrever numa redação enfumaçada e do cheiro de chumbo das linotipos ferventes, esses dificilmente conseguirão disfarçar uma certa palpitação.