Como a maioria das pessoas, tenho acompanhado com especial atenção os relatos dos passageiros e tripulantes que sobreviveram ao acidente com o avião da Chapecoense, os quatro brasileiros e os dois bolivianos, todos com alguma sequela, mas já fora de perigo. Num caso desses, é sempre muito perturbador entender por que esses indivíduos foram poupados pela mão da fatalidade ou por algum desígnio sobrenatural, dependendo da crença de quem interpreta.
A gente sempre procura uma explicação lógica: estava sentado no último banco, usou o cinto, adotou a posição recomendada pelos manuais de sobrevivência. Aí, ouve-se o sobrevivente e ele diz que não foi nada disso. A maioria conta que sequer percebeu o que estava acontecendo. Um conta que viajava no banco do meio e, quando acordou do choque, percebeu que os dois colegas de fileira estavam mortos.
Seja como for, não há como sair igual de uma experiência dessas. Percebe-se nas manifestações dos sobreviventes um imenso sentimento de gratidão e o firme propósito de encarar a vida de outra maneira. O lateral Alan Ruschel, por exemplo, faz questão de repetir nas suas entrevistas:
– O que eu levo da lição é viver a vida, aproveitar a vida e fazer o bem.
Na verdade, todos deveríamos pensar assim. O simples fato de estarmos vivos já deveria ser encarado como um milagre biológico, considerando-se a proporção dos que não nascem, a mortalidade infantil e as vidas abreviadas pela violência do dia a dia. Em algum momento de nossa existência, talvez também tenhamos sido selecionados pelo acaso ou por alguma força insondável sem ao menos percebermos.
Compartilho essas reflexões com meus leitores nesta véspera de Natal porque esta é uma época propícia para também pensarmos no que fazer com o restante de nossas vidas. Considerando-se o destino inexorável dos seres humanos desde o princípio dos séculos, somos todos sobreviventes. Serve-nos, portanto, a sábia decisão anunciada pelo jogador gaúcho:
– Aproveitar a vida e fazer o bem.
Feliz Natal para todos nós.