O indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro pela Polícia Federal (PF) no caso da falsificação de cartões de vacina já era esperado, e pode ser considerado o processo menos grave em sua lista de pendências com a Justiça. Não se trata de relativizar fraude em documentos públicos, o que evidentemente constitui crime. Entre seus aliados, contudo, há convicção de que o processo não teria força para colocá-lo atrás das grades, e que politicamente não traz desgaste junto à militância.
Entre as investigações em curso, a que mais preocupa Bolsonaro e seu entorno envolve o planejamento de um golpe de Estado, especialmente após as acusações feitas na última semana por ex-comandantes das Forças Armadas.
Com os elementos que reuniu nos últimos meses sobre a fraude em cartões de vacina da covid-19, a PF remeterá agora o processo contra Bolsonaro e outras 16 pessoas ao Ministério Público, a quem caberá avaliar a denúncia. O crime de associação criminosa prevê pena de 1 a 3 anos de prisão, enquanto o de inserção de dados falsos em sistema de informações varia de 2 a 12 anos. Há casos semelhantes em que os réus foram condenados a regime semiaberto.
Os primeiros elementos do caso foram revelados em fevereiro do ano passado, quando a Controladoria-Geral da União (CGU) recebeu denúncia de adulteração do cartão de vacinação de Bolsonaro e decidiu investigar. No mês seguinte, retirou o sigilo sobre o documento que havia sido imposto no governo anterior.
Após a PF realizar uma operação com mandados de prisão e de busca, em maio, Bolsonaro voltou a dizer que não se vacinou e negou que tenha inserido dados de vacinação no sistema do Ministério da Saúde. Há documentos que comprovam os dados do ex-presidente e de familiares no sistema. O que ainda não está claro é se a PF comprovou sua participação direta.
Durante o mandato, Bolsonaro já havia entrado nos Estados Unidos sem comprovar a imunização. O que preocupava auxiliares e familiares dele é que o documento fosse exigido pelas autoridades norte-americanas a partir de 2023, quando ele já estivesse fora do cargo.
Além da expectativa de que ele possa comprovar que não teve envolvimento direto na falsificação dos documentos, pessoas próximas ao ex-presidente consideram "fácil" justificar aos eleitores o motivo da manobra.
A lógica é que o ex-presidente sempre defendeu a liberdade de escolha sobre se vacinar ou não, e que o documento foi providenciado por um assessor apenas por ser uma exigência legal de outro país. O responsável pela iniciativa teria sido o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens da presidência que também foi indiciado.