
O avanço de investigações nesta semana sobre o suposto envolvimento de Jair Bolsonaro em uma série de crimes gerou alvoroço nas redes sociais sobre a possibilidade de o ex-presidente ser preso. Até agora, porém, nada indica que ele será alvo de prisão preventiva.
A medida não pode ser descartada, mas seria plausível somente diante de uma tentativa clara do ex-presidente em atrapalhar o trabalho dos investigadores, ou seja, no caso de obstrução de Justiça.
O que mais preocupa Bolsonaro e seus aliados no momento é a disposição do ex-ajudante de ordens da Presidência Mauro Cid em confessar o envolvimento na venda ilegal de joias recebidas como presentes para o Estado brasileiro.
Gerou pânico no entorno do ex-presidente a entrevista do novo advogado de Cid à revista Veja. À publicação, Cezar Bitencourt garante que o cliente irá admitir que agiu a pedido de Bolsonaro e entregou a ele o lucro das transações — nesta sexta (18), no entanto, o defensor falou em "erro da Veja" e que "não se falou em joias ".
Não se trata apenas da declaração de um advogado que a todo custo quer defender quem o contratou. Bitencourt é um criminalista experiente, com trânsito em Brasília.
Em nada se compara a de Frederic Wassef, advogado da família Bolsonaro que já admitiu participação no esquema de venda de joias e se prestou a esconder na própria residência um foragido da Justiça — no caso, Fabrício Queiroz, o homem por trás das investigações de rachadinha no gabinete do senador Flávio Bolsonaro.
O novo advogado foi procurado pela família do tenente-coronel, que não admite ver a responsabilidade sobre os supostos crimes recair apenas sobre ele. Bolsonaro comentou a entrevista de Bitencourt imediatamente. À TV Band, classificou a estratégia como "camicase" e disse que Mauro Cid fará qualquer coisa para deixar a cadeia.
O ex-presidente foi pego de surpresa porque nunca escondeu a relação de carinho e confiança com o ajudante de ordens, a quem chamava de filho. Cid acompanhou todos os passos de Bolsonaro e de seu entorno. Era responsável por tarefas pessoais, mas também por dar conselhos acerca do governo e até mesmo sobre a estratégia política e eleitoral do chefe.
A relação entre eles é antiga e envolve o pai de Cid, o general Mauro Cesar Lourena Cid, que foi colega de Bolsonaro no Exército. Além do desgaste causado à esposa e à filha do ajudante de ordens, a prisão irritou o general, que também está envolvido, segundo a Polícia Federal, em transações ilegais de joias.
A prisão imediata de Bolsonaro também é pouco provável porque a PF já obteve acesso à maioria dos arquivos que necessita para esclarecer a suposta participação do ex-presidente no caso das joias e em outras investigações, que envolvem o planejamento de um golpe de Estado e a falsificação de atestados de vacina.
Além da prisão de Cid e de outras possíveis testemunhas, a PF já apreendeu o celular do ex-presidente, de auxiliares dele e do advogado Frederic Wassef, além de documentos e outros arquivos. Com a recente autorização da Justiça, também terá acesso agora às transações financeiras do ex-presidente e de sua esposa, Michelle.
No caso da investida contra as eleições, a PF ouvirá novamente o hacker Walter Delgatti, que na quinta-feira (17) acusou o ex-presidente de encomendar invasão forjada às urnas eletrônicas e de ter grampeado o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.
As investigações certamente irão avançar nos próximos dias. Contudo, é preciso levar em conta também a cautela da PF nos casos que envolvem um ex-presidente da República. Por isso, com os elementos revelados até agora, a corporação deve priorizar a elaboração de uma peça robusta com provas que sustentem o envolvimento de Bolsonaro em crimes, e não solicitar imediatamente sua prisão preventiva ou outra medida semelhante.