Já foram tantos "quase" – e até um "fechou, só que não", em 2019 –, que há muito ceticismo sobre a real possibilidade de avanço no acordo de livre-comércio entre União Europeia e Mercosul, inclusive por parte da jornalista que assina esta coluna.
Houve até declarações suficientemente cautelosas para serem levadas a sério, como as da embaixadora da UE no Brasil, Marian Schuegraf, mas é o acúmulo de reações, nos últimos dias, que dá credibilidade à chance de um avanço efetivo. Os protestos de produtores de alimentos na França e a intempestiva promessa (ou ameaça?) do presidente do Carrefour acentuam o que, desses pontos de vista, pode ser um "risco iminente".
Preocupado com seu próprio cargo, o presidente da França, Emmanuel Macron, avisou na Argentina e reiterou no Brasil que seu país continua se opondo ao acerto. Em plena reunião do G20, repetiu que o as condições do acordo estão "desatualizadas" por terem sido negociadas "há muitas décadas".
Se Macron não está errado nesse ponto, há outro sobre o qual há dúvidas embasadas. O francês sustenta que não está isolado na oposição ao acordo. Nesta semana, o ministro da Agricultura da Itália, Francesco Lollobrigida, fez coro, afirmando que "em sua forma atual, (o acordo) não é aceitável". No entanto, a primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, teria passado impressão diferente nas conversas bilaterais em sua passagem pelo Brasil.
Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia (órgão executivo do bloco, equivalente ao de um primeiro-ministro), é defensora do acordo. Até há pouco dependente de consenso, a aprovação poderia ser feita por maioria.
Nesse caso, a França precisaria de ao menos outros três países para barrar a iniciativa e constituir a chamada "minoria de bloqueio" para evitar o avanço caso os favoráveis não alcance 65% da população do bloco. Caso Lollobrigida (o ministro, não a atriz) esteja certo, precisaria de outros dois. Os suspeitos de sempre para essa parceria são Polônia e Escócia.
Atualização: em nota, o Carrefour Brasil esclareceu o alcance da decisão anunciada por seu presidente internacional, leia a íntegra:
O Carrefour França informa que a medida anunciada ontem, 20/11, se aplica apenas às lojas na França. Em nenhum momento ela se refere à qualidade do produto do Mercosul, mas somente a uma demanda do setor agrícola francês, atualmente em um contexto de crise.
Todos os outros países onde o Grupo Carrefour opera, incluindo Brasil e Argentina, continuam a operar sem qualquer alteração e podem continuar adquirindo carne do Mercosul. Nos outros países, onde há o modelo de franquia, também não há mudanças.