Depois da esperada desistência do atual presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, o mercado tenta avaliar quais são os riscos relacionados a sua virtual substituta, a vice Kamala Harris.
Embora ainda seja preciso confirmar o nome na convenção democrata de 19 de agosto, Kamala já é vista e tratada como a nova candidata, não apenas por ter sido apoiada por Biden.
Um dos principais motivos pelos quais ela deve ser a candidata segue a mais famosa frase de campanha nos EUA - "it's the economy, stupid" (de James Carville para a campanha de Bill Clinton em 1992). Se Kamala não estiver na chapa, o Partido Democrata vai perder todos os fundos de campanha arrecadados até agora - e foram mais quase US$ 50 milhões (US$ 280 milhões) só nas horas seguintes à desistência de Biden.
No mercado, a tentativa de precificar o "risco Kamala" enfrenta a mesma dificuldade dos eleitores: definir qual será a agenda da democrata como eventual número 1 da Casa Branca. Um título da Bloomberg, agência de notícias especializada no mercado financeiro, resume os obstáculos: "Uma breve história de Kamala Harris e suas políticas".
Basicamente, Kamala é mais progressista do que Biden, tanto na política em geral quanto em economia. Sua carreira construída na Califórnia, Estado muito identificado com os democratas, sustenta essa imagem. Seus ataques a políticas de Donald Trump também. Quando o então presidente reduziu impostos, beneficiando os mais ricos, ela elaborou uma de suas frases mais conhecidas na economia:
— Francamente, essa economia não está funcionando para as pessoas que trabalham (em inglês, a frase tem mais impacto no trecho que repete palavra iguais para sentidos diferentes: "this economy is not working for working people").
Essa visão pode ajudar Kamala com o voto popular mas também a expõe a críticas da parcela do mercado mais suscetível ao "make America great again", conjunto de teses nacionalistas e protecionistas de Trump.
E embora Kamala seja a sucessora óbvia de Biden, convém aos democratas arrastar a oficialização. Não só para cumprir ritos internos que podem evitar risco de judicialização. Ainda no domingo, os republicanos avisaram que já têm um plano de ataque à atual vice-presidente.
Sem a definição oficial, porém, terão de diversificar a estratégia, por via das dúvidas. A ofensiva não será mais suave, mas pode ser menos concentrada. Perto do meio-dia no horário do Brasil, Kamala tem um discurso previsto. Todos os ouvidos do mercado estão abertos.
Atualização 1: até o final da manhã, as bolsas dos Estados Unidos reagem bem à virtual candidatura de Kamala Harris. O índice Dow Jones, o mais tradicional da bolsa de Nova York, é o mais cauteloso, com alta de 0,45%, o S&P 500, das maiores, está um pouco mais animado e sobe 0,95%, e o Nasdaq, das tecnológicas, avança 1,34%, mas neste caso o motivo está mais relacionado à alta nas ações da Nvidia, grande beneficiada pela combinação de movimentos geopolíticos relacionados à inteligência artificial.
Atualização 2: o Eurasia Group, que estimava em 75% a probabilidade de vitória de Donald Trump desde o debate em que ficou exposta a fragilidade de Joe Biden, agora recalibrou para 65%. Acredita na frase de Trump de que a troca de candidato facilita sua vitória quem ... acredita em Trump.