Quando se esperava que ondas de calor mundo afora e também aqui dentro, além de inundações nunca antes vistas no Estado, tivessem reforçado a urgência de frear a mudança climática, a Câmara dos Deputados cometeu uma façanha: aprovou a "agenda verde" e incluiu, na carona, um incentivo ao carvão - um dos maiores geradores de gases do efeito estufa.
Não bastasse a contradição e o "inconveniente" da agenda, a medida ainda terá custo para os contribuintes estimado em R$ 3 bilhões ao ano pela Associação Brasileira dos Grandes Consumidores Industrias de Energia (Abrace) - sem contar a "inconveniência" de ter sido aprovada na véspera da abertura da COP28, em Dubai.
Na noite de quarta-feira (29), a Câmara enfim aprovou a regulação das eólicas no mar, o que abre caminho para projetos de hidrogênio verde no Brasil. No entanto, uma emenda acrescentada de última hora no projeto prevê que a União dê prioridade à contratação de termelétricas abastecidas a carvão em momentos de necessidade, como o que acabou de ser configurado com a onda de calor no centro do país. O texto beneficia usinas cujos contratos se encerram até 2028 e, com a medida, poderiam ser recontratadas até 2050.
O projeto ainda tem de passar pelo Senado, onde o jabuti poderá, eventualmente, ser removido. Em nota, a Abrace afirma ter recebido "com surpresa a imposição de mais subsídios ao carvão na conta de energia no momento em que o país deve seguir sua vocação de energia limpa, barata e segura, ampliando o uso de fontes renováveis e que deveria mostrar para o mundo que podemos ser os líderes da transição energética com menos carbono".
A nota é de uma associação de grandes empresas, não é de ONG nem de ambientalistas que não têm foco na racionalidade econômica. É uma medida capaz de provocar reação até em Dubai, onde já grita a contradição entre a produção petrolífera e a realização de uma cúpula climática para discutir compromissos com o futuro do planeta.
Leia mais na coluna de Marta Sfredo