Em uma entrevista para um grupo de jornalistas do economista-chefe do Itaú, Mario Mesquita, que foi diretor de política econômica do Banco Central, a coluna quis saber qual era a percepção dele sobre a decisão que terá tomada na próxima semana pelo governo sobre a meta de déficit zero para 2024.
— Estive com o ministro e a postura dele me pareceu mais confiante de que nada muda por ora. Claro, vamos ver o que vai acontecer no final de semana e nos próximos dias — foi a surpreendente resposta de Mesquita, especialmente depois da imagem de incerteza do abraço entre Lula e Haddad.
Apesar dessa impressão, o economista-chefe do Itaú vê "grande incerteza" na questão fiscal. Ainda respondendo à coluna, Mesquita afirmou que o que preocupa o mercado sobre uma eventual mudança da meta de déficit zero para algo em torno de 0,5%, enquanto o mercado e o próprio economista projetam resultado negativo de 0,8% no próximo ano é o sinal:
— É como na política monetária. Se você abandona a meta de forma precoce, abala a credibilidade da política. E além de um problema de sinalização, há outro. O governo precisa arredar para cumprir a meta. E o déficit zero é um dos argumentos para convencer os parlamentares a frear a subvenção a empresas. Quando aumenta a meta, enfraquece o ponto na argumentação. Se sabe que o Legislativo tem enfrentado pressão das empresas, então por que o parlamentar vai incorrer em desgaste para viabilizar recursos para o governo se a necessidade de receita diminui com a mudança da meta?
Caso a meta seja de fato alterada, pondera, deve aumentar as projeções de inflação consideradas pelo Banco Central (BC) para futuros cortes de juro. E embora tenha considerado "benigno" o resultado do IPCA de outubro - a variação de 0,24% veio pouco abaixo da projeção média e da estimativa de 0,29% do Itaú -, avalia que não será suficiente para alterar a posição de "cautela" do BC na redução de juro.
Nesse caso, afirma, tem mais peso a alta remuneração dos títulos do Tesouro dos Estados Unidos, conhecidos como Treasuries:
— É o ativo financeiro mais líquido do mundo e impacta os preços de todos os outros. Sem acalmar lá fora, vai ser difícil acalmar aqui. Nunca se pode subestimar o efeito do contexto externo sobre o preço de ativos brasileiros. O Brasil é pouco integrado com o mundo comercialmente, mas muito integrado financeiramente. Então, o externo precisa acalmar antes de ceder aqui dentro.
Mesquita ainda avaliou que as recentes nomeações do governo não incomodam nem preocupam o mercado:
— O Paulo Picchetti é um economista muito respeitado, com base técnica muito sólida, foi professor de várias pessoas da minha equipe. Foi uma escolha muito bem recebida. Rodrigo Teixeira é um funcionário de carreira do BC, vem na linha de tantos outros que chegaram à diretoria e acabam sempre zelando pela instituição.
O que é déficit zero e por que é importante
A meta de déficit zero adotada pelo Brasil é um compromisso relacionado ao chamado "resultado primário", Isso quer dizer que o governo não vai gastar mais do que arrecada, sem considerar as despesas com a dívida pública. Significa que, ao não comprometer recursos que não tem (o que significa, na prática, gastar mais do que arrecada), não vai aumentar a dívida do Brasil. Ter déficit zero representa disposição de não elevar o já pesado endividamento público. Quanto maior a dívida, maior seu custo, o que dificulta a redução do juro.