No ano passado, o Brasil teve um período de deflação fake, em decorrência da redução artificial dos tributos sobre os combustíveis. Depois da deflação quase simbólica de 0,08% junho, o mercado projeta outra queda para este mês, ainda pouco visível a olho nu.
O primeiro sinal da repetição do resultado deve aparecer no IPCA-15 de julho, que será anunciado na terça-feira (24) pelo IBGE. E, desta vez, é deflação de verdade?
Mais ou menos. Os dois grupos de despesas que estão puxando os preços para baixo são os de alimentação e de transporte. No primeiro caso, trata-se de um movimento natural, portanto "de verdade", que resulta da combinação da redução no custo dos alimentos in natura, ajudada pela normalização nos segmentos de carnes, trigo e também graças à supersafra brasileira de soja. Isso leva especialistas a projetar que a alimentação no domicílio pode registrar deflação em 2023 pela primeira vez em seis anos.
No segmento de transportes, porém, a situação é um pouco mais complicada. Conforme o economista André Perfeito, com anos de experiência no mercado, os preços de gasolina e diesel "estão se afastando perigosamente dos seus valores internacionais". Para sustentar a afirmação, cita dados da Associação Brasileira de Importadores de Combustíveis (Abicom), segundo os quais o diesel estaria 16% abaixo da referência internacional, e a gasolina, 20%.
Presidente da Petrobras, Jean Paul Prates costuma sustentar que o cálculo da Abicom não é preciso e que a entidade, apesar do nome, não representa todo o mercado importador do Brasil. A coluna já explicou, com base em fontes independentes - ou seja, não ligadas ao atual governo - que a antiga Paridade de Preços de Importação (PPI) da Petrobras tinha fórmula desconhecida pelo mercado. Mesmo assim, os cortes anunciados até agora pela estatal elevaram sobrancelhas por coincidir - de forma conveniente para o cálculo da inflação - com momentos de pressão nos preços dos combustíveis.
A projeção para o recuo do IPCA-15 de 0,06% também tem, conforme Andréa Angelo, estrategista de inflação da Warren Rena, um desconto especial, que vem sendo chamado de "bônus Itaipu" aplicado na conta de energia dos consumidores em julho. É resultado de um saldo positivo no item "conta comercialização" da hidrelétrica binacional do ano passado. E ainda deve ter um soprinho do desconto-relâmpago na venda de automóveis. Ou seja, desta vez a deflação pode não ser 100% fake, como a do ano passado, mas tem, sim, alguns anabolizantes.