A intenção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de responder em até três semanas a "resposta do Brasil" à mais recente proposta de fechamento do acordo entre Mercosul e União Europeia (UE) precisa vencer vários obstáculos.
Dois são os mais desafiadores: a barreira dos europeus à importação de produtos de áreas recentemente desmatadas e a exigência de abertura a estrangeiros nas licitações públicas.
O conhecido protecionismo dos possíveis parceiros segue como pano de fundo, mas até diplomatas europeus já admitem oficialmente o óbvio: diante do novo cenário geopolítico, com aproximação de Rússia e China, assim como o avanço dos chineses tanto na África quanto na América Latina, os europeus precisam ampliar sua "área de cobertura".
Recentemente, o embaixador da Holanda no Brasil, André Driessen, apontou à coluna, em entrevista exclusiva, outro interesse na aproximação com a América Latina: as chamadas terras raras - grupo de 17 elementos químicos usados em supercondutores, que são uma espécie de petróleo da nova economia - , têm alta concentração na China, e também estão disponíveis em países como Brasil, Bolívia, Chile e Peru.
Não por acaso, na terça-feira (18), um dos anúncios mais promissores da reunião da UE com a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celalc) foi a intenção de investir 45 bilhões de euros (R$ 242 bilhões no câmbio atual) na região, especialmente em "transição verde e digital". Na prática, há dois principais eixos nessa definição: hidrogênio verde e terras raras. Então, interesse há, como constatou Lula ao dizer que nunca havia visto tamanha disposição para fechamento de acordos com a América Latina.
Mas será preciso ultrapassar os obstáculos. No caso do ambiental, o principal problema é o ponto de corte - o "marco temporal" da medida. A UE não quer importar nada que tenha passado por áreas de desmatamento a partir de 2020. No governo Lula, a data é considerada especialmente difícil, por representar um dos períodos de maior estrago na Amazônia, provocado pelo desmonte das estruturas de prevenção da gestão anterior. Mas se quiser de fato de diferenciar da estratégia de destruição que o precedeu, o atual presidente precisa contribuir para a solução.
No aspecto das chamadas "compras governamentais" - o que significa acesso de empresas europeias a licitações públicas nacionais - a dificuldade é maior. O governo se comprometeu com a reindustrialização do país, e abrir mão da reserva de mercado para empresas nacionais é claramente contraditório. Nesse caso, a Confederação Nacional da Indústria (CNI), que sempre foi aliada ativa na busca de soluções para o acordo, também pode cooperar para buscar uma saída.
Por fim, não é possível ignorar a proliferação das resistências internas europeias a seu próprio bloco. O Brexit pode ter sido pedagógico - o Reino Unido enfrenta tamanhas dificuldades depois de deixar a UE que hoje muitos dos apoiadores da saída lamentam a decisão. Mesmo assim, partidos nacionalistas têm crescido, como mostram as pesquisas para as eleições ao parlamento da Espanha, um dos países que mais se beneficiou dos fundos da UE. Nunca foi tão importante, nunca foi tão desafiador.