Agora que está esboçada a batalha jurídica entre a Americanas e credores com dívida estimada em R$ 40 bilhões, o protagonista do terremoto é o executivo que expôs as fragilidades da companhia - e suas motivações.
Sergio Rial tinha tal credibilidade no mercado financeiro e no universo corporativo em agosto de 2022 que, simplesmente com sua indicação, as ações da Americanas, que haviam caído 50% em sete meses recuperaram cerca de 40% em dois dias só diante de seu anúncio como novo gestor. Nesta segunda-feira (16), as ações voltaram a derreter, com tombo de 38,4%.
Formado em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e em Economia pela Universidade Gama Filho, Rial começou sua carreira no ABN Amro - banco holandês que vendeu suas operações ao Santander, mas anos depois que o executivo deixou sua operação. Apesar das passagens por instituições financeiras, é visto como "executivo generalista" do que como financista, até por ter atuado em empresas de outro segmentos, como Cargill e Marfrig. Assumiu a presidência do Santander Brasil em 2016, e comandou o banco até dezembro de 2021.
Foi sob sua gestão que o Santander se consolidou como quinta maior instituição financeira no Brasil. Foi o único banco estrangeiro a realmente ter sucesso no país. Não é pouca coisa. Embora tenha sido anunciado em agosto passado, Rial só assumiu efetivamente o cargo no último dia 2 de janeiro. No final da quarta-feira seguinte, só nove dias depois, publicou o fato relevante que estarreceu o mercado ao apontar "inconsistências" de R$ 20 bilhões e renunciou ao cargo. Por cinco dias, atuou como assessor do grupo 3G, formado por Jorge Paulo Lemann, Beto Sicupira e Marcel Telles, acionista de referência nas Americanas.
A até agora fulgurante trajetória começou a ficar mais opaca diante das dúvidas que Rial deixou abertas diante de um caso tão grave. No vídeo em que tenta explanar a situação das Americanas, afirma várias vezes, com total tranquilidade, que "ainda não tem todas as respostas" para as perguntas do mercado (assista clicando aqui).
A maior de todas é quanto ele sabia sobre a situação da Americanas ao aceitar a missão - e ao acionar a bomba do fato relevante. Outras cercam sua escolha: ao indicar um executivo mais identificado com o setor financeiro do que com o varejista, os acionistas já conheciam o desfecho da situação das Americanas, que agora travará uma batalha contra bancos credores?
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) abriu três processos administrativos para investigar o caso. Um deles investiga um suposto caso de insider information (uso de informação privilegiada) com operações feitas horas antes da publicação do fato relevante que teriam rendimento caso as ações da Americanas caíssem no dia seguinte. Renderam R$ 10 milhões. Além disso, o Ministério Público de São Paulo apura suspeitas de insider information no episódio de sua indicação, quando as ações também tiveram alta de 20% em um só dia.
Atualização: nesta segunda-feira (16), a Americanas anunciou a contratação da empresa Rothschild & Co. para renegociar sua dívida, no Brasil e no Exterior, conforme fato relevante publicano no site de relações com investidores:
A Americanas S.A. (“Americanas” ou “Companhia”), em atendimento ao disposto na Resolução CVM nº 44, de 23 de agosto de 2021, vem informar que seu Conselho de Administração em reunião no dia 16 de Janeiro de 2023, deliberou sobre a contratação do Rothschild & Co, que atuará como interlocutor da Companhia na renegociação da dívida, a nível Brasil e internacional. A Americanas reforça seu compromisso na busca de uma solução de curto prazo com os seus credores. Todos os órgãos sociais (conselho, diretoria e comitês) estão trabalhando conjuntamente com o objetivo de manter as operações da companhia de forma adequada.