Economista sênior da Tendências Consultoria, Juliana Damasceno vê na concessão feita ao Orçamento Secreto na PEC de Transição a ampliação de problemas estruturais das contas públicas. Previsibilidade faria bem ao mercado, diz
Na PEC de Transição o que é herança deixada pelo governo Bolsonaro e o que é criação da nova gestão de Lula?
Quando se fala em heranças deixadas por Bolsonaro e que tornam a movimentação obrigatória, há as remunerações, intensificadas esse ano e alguns setores específicos como investimentos estrangeiros e coisas mais setoriais. Fatores que não foram feitos pelo atual governo e que se complicam no contexto de agora, com a Emenda Constitucional 109, resultado da PEC Emergencial, em que existe a obrigação, por oito anos anos, com a redução dos gastos tributários pela metade, hoje próximos de 4% PIB. Para 2023, ao invés disso, teremos uma expansão, ou seja, estamos indo na direção contrária, por conta da ampliação de algumas renúncias. Isso pelo viés da receita, quando navegávamos em uma “onda de benevolência conjuntural”, com o aumento do preço de commodities, combustíveis, etc. Na despesa, é a elevação do Auxílio Brasil para R$ 600 que foi promessa de ambos e encomendou um gasto maior.
O que não seria necessário?
A equipe de transição não é de governo e não consegue cortar coisas ainda esse ano, mas poderia indicar o que poderia ser cortado. A Tereza Campello, que deverá estar à frente do Bolsa Família (atual Auxílio Brasil), indicou que fará um pente fino para evitar fraudes já apontadas pelo TCU, por exemplo. É importante essa perspectiva, para conter, que no médio e longo prazo, se gaste mais e pior. Seria importante sinalizar onde há espaço e onde não há.
Onde haveria?
Um dos indícios que apontam que Lula poderá não repetir governos anteriores é que durante a campanha bateu no Orçamento Secreto e flexibilizou o discurso para construir a base de governabilidade. Isso reafirma que a expansão do orçamento não sai de cena. Reconhece-se no Lula uma capacidade de negociação política ímpar, mas é importante utilizá-la, ou teremos as mesmas jabuticabas no orçamento. Durante, a Emendas 106 e 114, que protelavam o pagamento de precatórios não houve o esforço orçamentário para cortar os gastos antes de furar o teto. O corte pode até ser menor, mas é preciso uma tentativa de compensar dentro das despesas. Agora, é o mesmo caminho trilhado por Bolsonaro: o de tentar ganhar margem sem fazer o esforço político necessário para ajustar contas internas. É um problema estrutural que se perpetua. Não se deve contar apenas com ajudas conjunturais, mais cedo ou mais tarde será preciso enfrentar essas questões.
Isso deve elevar tributos?
Ou dívida, são os dois caminhos, sem corte de gastos sobra isso: carga tributária ou dívida. Num cenário mais aparado, teríamos mais previsibilidade, é isso que o mercado quer.