A coluna ficou impactada com pesquisa da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs) que apontou 64,4% das empresas do setor com dificuldade de contratar trabalhadores devido à falta de profissionais qualificados.
Embora o desemprego medido pelo IBGE - portanto inclui trabalho forma e informal - venha caindo (de 7,5% no primeiro trimestre para 6,3% no segundo), a situação ainda está muito longe da que provocou problema semelhante na década passada e chegou a ser chamada de "pleno emprego".
Na quinta-feira (29), a coluna recebeu e-mail de Douglas dos Santos, técnico com 15 anos de experiência em indústria eletrônica que está empregado neste momento, ponderando que "profissionais que sabem da qualidade do seu serviço (são bons, no popular), não se oferecem a determinados tipos de serviços pelo piso salarial". E complementou:
— Muitas vezes, são colocados no mesmo patamar salarial um profissional com anos de experiência e outro com até cinco anos de carreira, sem margem de negociação salarial. Nas ofertas de emprego onde o salário está 'a combinar', na maioria dos casos é o piso salarial para uma vaga cheia de requisitos, ou o serviço a ser executado exige disponibilidade incompatível com o salário que será oferecido.
Para explicar a aparente contradição entre milhões de gaúchos que buscam vagas e a dificuldade da indústria em contratar, a coluna ouviu o professor de Economia da PUCRS Adalmir Marquetti, especializado em crescimento econômico. Ele ponderou que a remuneração é, de fato, um componente do problema:
— Quando se compara dados atuais aos de 2014, 2015, há queda na média do salário real. Além disso, a Pnad (Pesquisa Nacional de Amostragem por Domicílio, do IBGE) mostra que um profissional com MEI (registro de microempreendedor individual), pagando todos os tributos, tem rendimento médio acima de quem é trabalhador com carteira assinada. Isso pode criar dificuldade de contratar, porque se trabalhar por conta própria pode ganhar mais.
Ainda pondera que os profissionais saem da escola, mesmo as do Ensino Médio profissionalizante, com conhecimento mais geral. O específico tem de ser propiciado pelas empresas. Nesse processo, a queda na qualidade da educação no Estado é outra barreira, diz:
— A educação básica deveria permitir e facilitar o treinamento. Quando fica muito precária, dificulta o aprendizado adicional. Mesmo nas empresas que têm treinamento próprio, leva tempo para formar um trabalhador qualificado. Para fazer pesquisa e desenvolvimento, por exemplo, o indivíduo tem de se capacitar, depois mergulhar na área específica do trabalho para responder às demandas.
Outro ponto de atenção no Estado, acrescenta Marquetti, é a questão demográfica. Houve queda na taxa de natalidade e a população na faixa de entrada no mercado de trabalho vem caindo. Conforme dados do Departamento de Economia e Estatística (DEE), a população com até 30 anos caiu 8,9% de 2012 a 2021.
— Esse é um problema que pode afetar vários setores. O número de jovens é muito menor do que há 20 anos. O Rio Grande do Sul precisaria de uma política de migração, que pudesse atrair determinado tipo de profissional, semelhante à do Canadá — sugere.
Terminou? Não, porque uma realidade contraditória sempre tem inúmeras causas, inclusive uma geracional. Com convívio na sala de aula, Marquetti lembra que os jovens de hoje têm valores distintos:
— As crianças cresceram de forma diferente, mesmo nas classes populares. A covid-19 também mudou maneira como jovens se relacionam com o trabalho. As empresas precisam repensar práticas, como flexibilidade de horário e possibilidade de salários maiores.