Depois que o resultado de 2021 foi recebido com alívio na Marcopolo, o balanço do primeiro trimestre arrematou a perspectiva de virada na empresa. De janeiro a março, a fabricante de ônibus teve aumento de 14,9% na receita líquida ante o primeiro trimestre de 2021, para R$ 958,6 milhões, e lucro líquido de R$ 98 milhões. O CEO da companhia, James Bellini, já havia anunciado a volta às contratações e agora tem um número a apresentar à coluna: foram mil novos funcionários agregados ao time desde janeiro. Nesta entrevista, Bellini confirma o que todos imaginavam: a Marcopolo venceu o pregão para fornecer ônibus ao governo federal, por meio do Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação (FNDE), que teve seu resultado suspenso até que o Tribunal de Contas da União (TCU) libere os valores questionados pelo Ministério Público de Contas.
Resultados bons no primeiro trimestre embalam a empresa para o ano?
Sim, estamos começando a ver uma boa melhora, apesar das dificuldades que continuam, principalmente na falta de componentes. A falta de chassis nos atrapalha bastante. Mas conseguimos atingir um resultado bom, o que demostra que o resto do ano deve realmente cumprir com expectativa de ser um ano muito.
Os chassis levam muitos semicondutores?
Têm um módulo eletrônico que comanda seu 'cérebro'. É esse módulo está faltando. As montadoras produzem os chassis, mas não podem faturar porque falta o módulo. Tem pátios praticamente lotados com chassis esperando módulos. E nós, esperando porque tem carros que devem entrar em produção no dia seguinte mas não tem chassis.
A Marcopolo está entregando ônibus sem componentes?
O que temos feito é trabalhar com o conceito de 'módulo escravo'. Como não tem módulos para todos, as indústrias mandam chassis e um lote de módulos em separado, para intercalar, algo entre 30% e 40% do que seria necessário. Nós damos entrada na produção com os que têm, quando termina vê se tem mais, senão retira, coloca nos próximos e espera que cheguem os definitivos. Mas não estamos entregando sem módulo. Só fazemos essa alternância para não parar a produção, serão teríamos um grande problema. É um jeitinho brasileiro de ir resolvendo as coisas.
Há perspectiva de solução?
Tudo o que se falou até agora não aconteceu. Era para ser em março, não foi; abril, também não. Agora, está se falando que pode haver regularização a partir do final de maio. Mas já virou aquele discurso do economista sobre o dólar. Ninguém nunca sabe o que vai acontecer. É muito difícil responder a essa pergunta, não existe resposta consistente. Vamos ter de aguardar, cruzando os dedos.
No trimestre anterior, a retomada do programa Caminhos da Escola foi apontada como uma boa perspectiva. Como foi para a Marcopolo a suspensão da licitação?
Existe uma questão política envolvendo esse tema, estamos em ano eleitoral. Infelizmente, está afetando o programa. No último pregão, a gente realmente venceu. Vencemos todo o programa. Como os preços foram colocados em dúvida, a confirmação está em análise no TCU (Tribunal de Contas da União), que pediu explicações para o FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) sobre o aumento de preços. A questão é que o aumento é mais do que justificável, dado o processo de inflação que o país está vivendo. Não só o país, mas todo o mundo. O aço subiu mais de 100% e tem muito peso no custo da carroceria dos ônibus. Os componentes subiram. Isso muda a configuração do preço. Agora, vamos aguardar a conclusão da análise do TCU para que possa homologar o resultado. São cerca de 3,85 mil ônibus em quatro lotes, três ganhamos com chassis da MAN, outro sozinhos, com os ônibus Volare.
Como a Marcopolo encarou a suspeita de superfaturamento?
Temos um departamento de compliance (que deve garantir o cumprimento das leis e regras) que está acima do conselho de administração, é superior a qualquer decisão da empresa. Nem eu, nem o presidente do conselho podemos fazer alguma coisa se a compliance barrar. Essa é uma questão tranquila para nós. Não tem como passar uma irregularidade desse tipo. Nem na Marcopolo, nem na Mercedes-Benz, nem na MAN. São empresas com compliance muito bem estabelecido. Não houve sequer uma acusação envolvendo o nome da Marcopolo. Se tivesse haviado, teríamos toda a tranquilidade de apresentar toda a documentação que comprova que isso não existe. O aumento ocorreu por inflação. Nas consultas a todas as empresas e previamente no pregão, justificamos por que os valores mínimos são esses. Temos notas fiscais, toda a documentação que comprova o aumento real do produto. Carros subiu, moto subiu, bicicleta subiu, por que o ônibus não vai subir? É a mesma coisa.
Por que a empresa decidiu anunciar antecipadamente a mudança no comando?
Já estava prevista. Quando assumi a presidência, a ideia era de que minha gestão fosse temporária, para dar tempo de preparar o sucessor. No meio desse processo, veio a pandemia, que se estendeu por mais de dois anos. O conselho de administração entendeu que não seria prudente dar continuidade ao processo sucessório enquanto a pandemia não desaparecesse. Agora, retomamos e comunicamos que, a partir de novembro, o André (Vidal Armaganijan) será o CEO. Foi o executivo escolhido para me suceder. Resolvemos anunciar um ano antes para ter tempo, dar tranquilidade, fazer a transição de forma saudável, sem atropelos. O André já trabalha comigo todos os dias nesses três anos em que estou aqui. Não vejo que terá qualquer problema. Tem muita competência.
Como a Marcopolo vê o futuro?
Com uma perspectiva muito boa. Estamos vendo, a partir de agora, um ciclo de crescimento da empresa. De fato, já começou. No primeiro trimestre, contratamos mais mil, além das que já havíamos falado. O mercado está reagindo, voltando. Há uma retomada forte no mercado do transporte rodovário de passageiros. Além do deslocamento provocado pelo aumento das passagens aéreas, há outro impacto: com a gasolina mais cara, as pessoas estão deixando de viajar de carro e voltando para os ônibus.