O jornalista Rafael Vigna colabora com a colunista Marta Sfredo, titular deste espaço.
A guerra entre a Rússia e a Ucrânia expôs mais um paradoxo do Brasil. De um lado, o país é protagonista na produção agrícola, responsável, hoje, segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO, na sigla em inglês), pela segurança alimentar no mundo. Por outro, é totalmente dependente do mercado externo de fertilizantes, importando 85% do adubo usado nas lavouras nacionais de países como Marrocos, Rússia e Canadá.
Essa realidade é alvo de esforços do governo federal. Iniciados pela então ministra, Teresa Cristina e continuada pelo atual titular da pasta Marcos Montes, a chamada diplomacia dos fertilizantes busca diversificar fornecedores, que, apesar de necessário em curto prazo para não haver a quebra de insumos essenciais, não corrigem o problema em si, a dependência. Apenas a transfere para outros atores.
Por certo, nenhum país, com exceção de Rússia e China, é autossuficiente em fertilizantes. Na União Europeia, por exemplo, a demanda beira os 50%, nos Estados Unidos, 24%, de acordo com dados do Sindicato da Indústria Nacional de matérias-primas de Fertilizantes (Sinprifert). Por aqui, enquanto o país caminha a passo largos para ampliar a dependência a 90%, nível considerado mais do que crítico, o Peru é um grande fornecedor de fosfatados aos Estados Unidos, mas não para o Brasil. A Argentina, por sua vez, possui jazidas de Potássio que poderiam suprir a dependência interna desta matéria prima que já é de 97%.
Ou seja, de acordo com o diretor-executivo do Sinprifert, Bernardo Silva, o primeiro passo seria criar sinergia com países mais próximos geográfica e politicamente. Na esteira das necessidades em março, foi assinado o decreto federal para o Plano Nacional de Fertilizantes, com diretrizes para diminuir essa dependência na matriz NPK (Nitrogênio, Fósforo e Potássio), com investimentos internos que poderiam reduzir em até 50% essa dependência.
A primeira reunião do conselho que fará a gestão e o monitoramento aconteceu em abril e a segunda ocorrerá em junho, quando toda a agenda será implementada. No Estado, um dos empreendimentos que aguarda a Licença de Instalação é o Projeto Fosfato Três Estradas, da Aguia Fertilizantes, em Lavras do Sul, que garante o um processo de extração de fosfato natural com zero utilização de água, energia e carbono, mas esbarra nas questões ambientais. Outro em São José do Norte e um no Paraná também se encontram hibernados por razões semelhantes.
Na prática, Silva sustenta que quanto mais próximo for o fornecimento de insumos para o agricultor local, maior será a renda e a produtividade, pois as soluções seriam customizadas. Há ainda a possibilidade de produtos de melhor qualidade que gerariam ganhos de produtividade e abririam espaço para competição no mercado que, potencialmente, poderia reduzir preços de insumos e, outra vez, trazer reflexos positivos para renda e produtividade.
Para se ter uma ideia, atualmente, mesmo com o real mais valorizado frente ao dólar, o preço dos insumos agrícolas disparou: uma tonelada de potássio, por exemplo, que antes da guerra custava US$ 300, hoje é vendida acima de US$ 1,1 mil. Mais um problema que vai cair no colo dos produtores, e consequentemente, dos consumidores mais adiante.