Nos primeiros dias após o ataque da Rússia à Ucrânia, o temor de escassez de fertilizantes jogo luz sobre um negócio anunciado menos de um mês antes: a venda da Unidade de Fertilizantes Nitrogenados (UFN III), da Petrobras, para a russa Acron. O assunto virou até tema de apresentação da pré-candidata à Presidência, Simone Tebet (MDB), que era prefeita de Três Lagoas (MS), onde fica à unidade, na época da negociação.
Depois de dois meses de uma guerra que enfrenta sucessivas ameaças de escalada nuclear por parte da Rússia, a Petrobras anunciou nesta quinta-feira (28) o único desfecho possível: o cancelamento do negócio.
Em nota, a estatal afirma que "está realizando os trâmites internos para encerramento do atual processo de venda e lançamento de um novo teaser (comunicado com as bases da oferta) tão logo possível. A previsão é lançar o novo processo já no início de junho". Ainda segundo a Petrobras, "o plano de negócios proposto pelo potencial comprador, em substituição ao projeto original, impossibilitou determinadas aprovações governamentais (destaque da coluna) que eram necessárias para a continuidade da transação".
Ou seja, pegou tão mal que o governo Bolsonaro encontrou uma forma de barrar o avanço do negócio que representava ainda mais concentração de mercado nas mãos dos russos, que já respondem por um quarto das importações do Brasil, que chegam a 85% das necessidades de fertilizantes. O vice-presidente da Acron, Vladimir Kantor havia dito em março que a intenção era "começar a trabalhar (na retomada do projeto) já em julho".
Assim que a guerra começou, surgiu a dúvida sobre a concretização do negócio, que chegou a ser chamado de "a primeira vítima da guerra no Brasil". A coluna havia consultado a Petrobras à época, que respondera apenas que não existia, até aquele momento, "atualização sobre o processo de venda da UFN III". Quase dois meses depois, saiu o anúncio oficial de cancelamento.
Agora, recomeça a tentativa de encontrar um investidor que termine a obra e reforce a produção nacional de fertilizantes. Não será uma tarefa simples, mas há uma diferença substancial: agora, há uma aguda consciência da necessidade de reduzir a dependência de importados em geral, e especificamente, da Rússia.
O que é a UFN III
Foi uma das unidades de produção de fertilizantes criadas nos governos petistas, a partir do diagnóstico correto de que o Brasil é excessivamente dependente de importações na área. A construção iniciou em 2011. Uma década e cerca de R$ 3,7 bilhões depois, segue inacabada, com suspeitas de desvio de recursos. Deveria cortar à metade a dependência do Brasil da importação de amônia e ureia, atualmente em cerca de 85%. A matéria-prima seria o gás natural do duto Bolívia-Brasil.
A íntegra da nota da Petrobras
"A Petrobras, em continuidade aos comunicados divulgados em 21/02/2020 e 04/02/2022, informa que não foi concluído o processo de venda da Unidade de Fertilizantes Nitrogenados III (UFN-III), no município de Três Lagoas, no Mato Grosso do Sul, com o grupo russo Acron, tendo em vista que o plano de negócios proposto pelo potencial comprador, em substituição ao projeto original, impossibilitou determinadas aprovações governamentais que eram necessárias para a continuidade da transação.
Assim, a companhia está realizando os trâmites internos para encerramento do atual processo de venda e preparando o lançamento de um novo teaser tão logo possível. A previsão é lançar o novo processo já no início de junho.
A Petrobras reforça o seu compromisso com a ampla transparência de seus projetos de desinvestimento e de gestão de seu portfólio e informa que as etapas subsequentes do projeto serão divulgadas de acordo com a Sistemática de Desinvestimentos da companhia."