Em 2021, a Petrobras somou lucro líquido (aquele "limpinho", livre de impostos, juros, etc.) de R$ 106,668 bilhões, o maior anual da história da empresa.
Lucro não é motivo de vergonha, ao contrário, quando obtido de forma lícita e com respeito a todos os públicos, é fonte de orgulho, mas para a Petrobras neste momento, virou constrangimento.
Na nota em que comunica os resultados, a estatal adota um discurso de justificativa para o resultado bilionário de três dígitos enquanto os brasileiros penam com preços recordes de combustíveis. O presidente, Joaquim Silva e Luna, afirma, no comunicado:
- A Petrobras gerou resultados consistentes, mostrando que uma empresa saudável e comprometida com a sociedade é capaz de crescer, investir, gerar empregos, pagar tributos e retornar dinheiro aos seus acionistas, contribuindo efetivamente para o desenvolvimento do país. Nada disso seria possível para uma empresa endividada sem capacidade de gerar valor. Estes resultados demonstram que a qualidade do nosso trabalho se traduz de maneira inequívoca em riqueza para a sociedade.
Tanto não é "inequívoca" que o diretor financeiro e de relacionamento com investidores, Rodrigo Araujo Alves, fez questão de citar, na mesma nota, o pagamento de R$ 200 bilhões em impostos ao longo de 2021. Não mencionou, mas o mercado fez as contas: a estatal vai distribuir nada menos de R$ 101,4 bilhões em dividendos a seus acionistas, praticamente o mesmo valor do lucro. E, graças aos conflitos entre Congresso e equipe econômica, os acionistas receberão esse dividendos sem pagar um real de Imposto de Renda.
Certo, é uma espécie de "dívida" que a estatal tinha com seus acionistas, dados os prejuízos acumulados com a política de preços nos governos do PT. Mas está quitando as pendências com muitas sobras. Apesar de estar ensombrecido pela guerra entre Rússia e Ucrânia, o lucro descomunal desafia a lógica do brasileiro médio, que associa o alto preço nas bombas ao resultado excepcional e não vê vantagem no seu bolso nos "feitos" celebrados pela Petrobras, como antecipar em 15 anos a redução no endividamento bruto para US$ 60 bilhões.
O lucro foi permitido pela aplicação da Paridade de Preços de Importação, a política que atrela os preços nas refinarias aos valores internacionais e à cotação do barril de petróleo tipo brent, que nesta quinta-feira, inflamado pelo ataque da Rússia à Ucrânia, disparou para US$ 105. No Congresso, tramita uma tentativa de suavizar as flutuações, com efeitos colaterais e dificuldades de avanço. Um momento delicado para um ganho deste tamanho.
A alta do petróleo não beneficiou só a Petrobras, mas todas as petrolíferas privadas. Mas superou até o da gigante Shell, que lucrou US$ 19,3 bilhões (R$ 96,7 bilhões), a referencial BP, que obteve US$ 12,8 bilhões (R$ 64,1 bilhões). Sim, a estatal que tem ações no mercado precisa atender a seus acionistas. Mas antes de celebrar o resultado, terá de dar explicações sobre os três dígitos de bilhões.