Nem havia baixado a fumaça da mudança no Imposto de Renda, considerada ruim por tributaristas e reformistas e da enésima tentativa de criar um novo tributo para desonerar a folha de pagamento, o governo Bolsonaro decidiu, com um canetaço, aumentar a alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
A principal consequência da decisão, tomada por decreto, é encarecer o crédito em ciclo de alta no juro básico, que já tem projeção de chegar a 10% no final do ano. O principal motivo é financiar um programa social mais robusto do que o Bolsa Família, o Auxílio Brasil, para que o presidente se cacife para a campanha eleitoral de 2022.
Enquanto o ministro da Economia, Paulo Guedes, sinalizava com calote parcial nos precatórios para abrir espaço no orçamento, o que já inquietava economistas e mercado financeiro, Bolsonaro atalhou a conversa e fez o segundo aumento do IOF em seu mandato, depois do canetaço de estreia no cargo.
Se é verdade que o orçamento de 2022 está curto, já embute uma grande folga em relação ao deste ano, porque o teto de gastos do próximo ano é corrigido pela inflação de julho de 2020 a junho de 2021. A "folga extra" obtida graças à inflação que pesa no bolso da população chega a R$ 124 bilhões do próximo ano. Mesmo assim, o presidente quis arrecadar mais R$ 2,14 bilhões com o segundo aumento do IOF em seu governo.
Conforme Miguel Ribeiro de Oliveira, diretor executivo de estudos e pesquisas da Associação Nacional de Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), o custo total de um financiamento capital de giro para empresas de R$ 50 mil com juro mensal de 1,5% em 12 parcelas aumenta 0,53%, de R$ 55.833,12 para R$ 56.130,12.
– Foi uma medida muito ruim para o crédito, para a atividade econômica. Estamos em ambiente com endividamento extremamente elevado, a Selic está subindo, a atividade está andando de lado, com projeções de alta do PIB para o ano que vem já próximas de zero. A inflação está elevada, corroendo a renda das famílias. Neste momento, aumentar a carga tributária que incide sobre o crédito prejudica ainda mais o crescimento econômico e aumenta o endividamento – afirma Oliveira.
No mercado financeiro, o canetaço do IOF acentua a alta de 0,78% no dólar, para R$ 5,30, e a queda de 1,85% na bolsa, que está em 111.686 pontos, patamar mais baixo desde março passado. Esse foi o tom geral da reação ao canetaço presidencial que pode virar um tiro no pé se o custo mais alto do crédito desacelerar a economia em 2022, respaldado em comentários como os de Ana Carla Abrão, líder da consultoria Oliver Wyman no Brasil, e do diretor-geral do Instituto Fiscal Independente, Felipe Salto.
Atualização: à tarde, a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), que havia se atritado com o governo Bolsonaro na época do manifesto A Praça é dos Três Poderes, divulgou nota afirmando "esse aumento do IOF é um fator que dificulta o processo de recuperação da economia". Leia a íntegra abaixo:
POSIÇÃO DA FEBRABAN SOBRE AUMENTO DO IOF
Aumento de impostos sobre o crédito, mesmo que temporário, agrava o custo dos empréstimos, particularmente em um momento em que o Banco Central precisará subir ainda mais a taxa básica de juros para conter a alta da inflação. O resultado é o desestímulo aos investimentos e mais custos para empresas e famílias que precisam de crédito. Esse aumento do IOF é um fator que dificulta o processo de recuperação da economia.
Para enfrentar as dificuldades fiscais, evitar impactos negativos no custo do crédito e propiciar a retomada consistente da economia, só há um caminho: perseverarmos na aprovação da agenda de reformas estruturais em tramitação no Congresso.