Uma cena do futuro próximo pode ser mais ou menos assim: os vizinhos se cotizam e pedem abastecimento dos carros do condomínio por delivery.
Hoje inimaginável, a venda de combustíveis em telentrega proposta pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) terá audiência pública na próxima quarta-feira (7), depois de um mês e meio de consultas. É mais uma das mudanças profundas pelas quais passa esse mercado, que acabou de se tornar 100% privado.
– Há uma ânsia de disrupção, de romper com tudo, mas algumas propostas que envolvem segurança deveriam ser mais debatidas, com propostas mais organizadas – reclama João Carlos Dal'Aqua, presidente do Sulpetro, o sindicato estadual dos postos de combustíveis.
A proposta da ANP prevê que a telentrega tenha de ser atrelada a um posto, para ter a quem responsabilizar em caso de qualquer problema. Além dos aspectos relacionados à segurança – o armazenamento de combustíveis é superregulado nos postos por envolver líquidos altamente inflamáveis –, Dal'Aqua pondera que esse tipo de venda estará muito exposto a falsificação e sonegação:
– Vai acabar podendo desovar produto roubado ou com algum outro problema com mais facilidade. A ANP já não consegue fiscalizar os pontos fixos, imagina os móveis. Em um país com fiscalização estruturada, até poderia funcionar, mas aqui vai virar gandaia.
As bases para a proposta da ANP, que inclui outras mudanças, são a Lei da Liberdade Econômica, sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro em setembro de 2019, e a resolução do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) de dezembro do mesmo ano.
O entendimento de que já havia condição legal para esses tipo de operação já fez surgir um serviço no Rio de Janeiro, que transporta gasolina em caminhonetes equipadas com tanque e bomba de combustível para atender pedidos feitos por um aplicativo. É operado por um posto que recebe combustível da distribuidora Fit Combustíveis, da Refit, antiga Refinaria de Manguinhos.
A justificativa da ANP para permitir delivery de combustíveis é "reduzir o ônus dos agentes que atuam no mercado de combustíveis, viabilizar a inovação a partir de novas formas de atuação e dinamizar a oferta pelo fomento de novos arranjos de negócios". A audiência pública será realizada das 10h às 14h da próxima quarta-feira e pode ser acompanhada por qualquer interessado, mas é preciso um cadastramento prévio (clique aqui para ter acesso ao formulário).