A ameaça do presidente Jair Bolsonaro à Petrobras em transmissão pelas redes sociais já reverbera sob a forma da desvalorização das ações da estatal, mas a repercussão vai muito além da variação no mercado financeiro.
Ao ameaçar o presidente da estatal, Roberto Castello Branco, na tentativa de tranquilizar os amigos caminhoneiros, Bolsonaro não sabe em que vespeiro mexeu.
É verdade que são muito fora da curva os aumentos nas refinarias anunciados na quinta-feira (18), de 10% na gasolina e de 15% no diesel. Representam acúmulo ao redor de 35% e 28%, respectivamente, nos primeiros 50 dias de 2021.
Mas a reação correta seria rever a formação de preços em linha com o que fazem países desenvolvidos, como a Dinamarca, não agir como líder populista de republiqueta de baixa credibilidade, abrir mão de receita com rombo nas contas e ameaçar auxiliares de forma velada.
A afirmação de que "algo vai acontecer na Petrobras nos próximos dias" está sendo associada à reunião do conselho de administração da empresa de deve discutir a recondução de seu presidente, Roberto Castello Branco. Deveria apenas renovar o mandato por mais dois anos. Mas depois da fala de Bolsonaro, será crucial para a definição do futuro do executivo, da Petrobras e do próprio governo.
Conforme o colunista Lauro Jardim, de O Globo, Castello Branco já avisou que não pedirá demissão, uma das consequências que Bolsonaro gostaria de ter provocado. Segundo a colunista Miriam Leitão, também de O Globo, o conselho de administração ameaça renunciar se o presidente mantiver a pressão.
Ao Valor Econômico, o integrante do conselho indicado pelos acionistas minoritários da Petrobras, Marcelo Mesquita, sócio-diretor da Leblon Equities, criticou o que chamou de "gritaria incompreensível" do presidente. Afirmou que "uma pessoa que tem poder não pode ficar vociferando coisas assim", que geram volatilidade e geram dificuldade para o ambiente de negócios no país.
– Não adianta se eleger e dizer que vai fazer diferente do PT, mas fazer tudo igual. Isso é estelionato eleitoral – reforçou.
Antes da desastrosa live de quinta-feira (19), o mercado já havia ligado o radar da suspeita porque a Petrobras havia atrasado o repasse do aumento do petróleo sobre os combustíveis no Brasil. A confiança não havia sido recuperada depois do reajustaço, disse à coluna Walter de Vitto, analista do setor na Tendências Consultoria Integrada:
– Essas mudanças sem anúncios públicos na política de preços criam dúvidas sobre a credibilidade da administração da empresa.
Na manhã desta sexta-feira (19), quando a queda nas ações da Petrobras chegou a 6% em reação à ameaça presidencial, um interlocutor de Bolsonaro disse à coluna esperar "que nada aconteça". Lembrou que o presidente é muito impulsivo e um "animal político" que falou a um público que não é a elite empresarial nem o mercado financeiro.
Esse interlocutor afirma que o presidente foi aconselhado várias vezes a não se manifestar dessa forma sobre a Petrobras e duvida que Bolsonaro soubesse da reunião do conselho da Petrobras sobre o mandato de Castello Branco, portanto não teria real intenção de removê-lo do cargo.
Ao dobrar a aposta nesta sexta-feira (19), dizendo que "haverá, sim, mudança na Petrobras", o presidente faz o oposto do que cobra da estatal: em vez previsibilidade, oferece mais incerteza ao tornar ainda mais ampla a possibilidade do que vai alterar. A queda nas ações foi aprofundada para mais de 7%. Foi ouvido pelos dois segmentos que podem fazer diferença no seu futuro.