O pagamento do auxílio emergencial reduziu a pobreza no Brasil, mas o coronavírus provocou grandes estragos na renda do trabalho. O estudo "Efeitos da pandemia sobre o mercado de trabalho brasileiro: desigualdades, ingredientes trabalhistas e o papel da jornada" mostra onde esse impacto foi maior.
O Rio Grande do Sul foi o oitavo Estado que mais perdeu renda do trabalho no segundo trimestre deste ano, com queda de 20,5% em relação a igual período de 2019, e Porto Alegre foi a terceira capital com maior tombo, de 29,2%, quase o mesmo das duas mais afetadas, Recife (29,5%) e Maceió (29,4%).
O dado de Porto Alegre chama atenção por ser muito maior do que o de Curitiba, que perdeu 21,3%, a 11ª maior redução, e quase 10 vezes acima do de Florianópolis, onde a diminuição na renda do trabalho se limitou a 3,9%. Os números da capital gaúcha estão bem acima da média nacional, de queda de 20,1%, de R$ 1.118 para R$ 893 no país.
O principal motivo da queda na renda do trabalho, conforme o pesquisador, foi a redução de 14,3% na jornada de trabalho. Na avaliação do diretor da FGV Social, o fato de a medida poupar postos de trabalho socializa perdas e evita cicatrizes permanentes no mercado de trabalho. No caso do Rio Grande do Sul, o número de horas trabalhadas diminuiu 8,4%, enquanto o salário por hora encolheu 7,3%. Em Porto Alegre, embora o número de horas trabalhadas tenha apresentado menor redução, de 7,3%, o salário por hora levou um tombo de 13,9%.
Néri destaca que os principais perdedores da crise, desse ponto de vista, foram indígenas (28,6%), analfabetos (27,4%) e jovens entre 20 e 24 anos (26%). A metade mais pobre da população perdeu 27,9% da renda, de R$ 199 para R$ 144 (sim, por mês), enquanto os 10% mais ricos perderam 17,5%, de R$ 5.428 para R$ 4.476. E observa, em relação à pesquisa passada, que havia mostrado queda na pobreza, que há uma espécie de paradoxo: a renda dos mais pobres está no "céu" (considerando a melhora) e o trabalho, no inferno.
– Esses contrastes sugerem que, quando acabar o "efeito-anestesia" do auxílio emergencial, a situação social pode piorar muito se os resultados trabalhistas não forem revertidos – adverte Néri.