Enquanto a proposta que previa regras emergenciais para evitar quebra de empresas durante a pandemia ficou parada, o projeto que define mudanças definitivas na chamada Lei de Falências avançou.
Foi aprovado na semana passada o PL 6.229/05, que abre possibilidade de recuperação extrajudicial, financiamento na fase de recuperação judicial, parcelamento de dívidas tributárias federais e apresentação de plano de recuperação por credores.
Ainda falta a confirmação pelo Senado, mas o texto tem o apoio do Ministério da Economia, o que tende a facilitar a aprovação. Professor da FGV Direito Rio, Márcio Souza Guimarães integrou a comissão de juristas que atuou a montar o projeto, detalhou à coluna que um dos objetivos das mudanças é exatamente evitar uma temida explosão nos pedidos de recuperação judiciais ou falências.
Conforme dados da Boa Vista SCPC, em julho o número de pedidos de recuperação judicial caiu 37,6%, e o de falências decretadas, 12,6% em relação ao mesmo mês de 2019, mas especialistas advertem que o impacto da pandemia só vai impactar esses indicadores nos próximos meses. A incerteza sobre o efeito do crédito nas empresas e a capacidade de resistir à extensão da pandemia fez com que as mudanças que começaram a tramitar há quase 15 anos ganhassem velocidade agora.
Para Guimarães, uma das principais novidades é a possibilidade de negociação prévia, uma espécie de recuperação extrajudicial, que permite suspender as execuções de dívidas por 60 dias, situação hoje permitida apenas depois do pedido à Justiça. Guimarães detalha que eventuais descontos no valor principal dos débitos concedidos por credores nessa etapa serão anulados caso a empresa em dificuldades não cumpra os compromissos assumidos sem intervenção judicial.
Apesar do empenho da equipe econômica, as novas regras estão longe da unanimidade. Rodrigo Tellechea, sócio do escritório Souto Correa nas áreas de Insolvência e Direito Societário, avalia que o projeto "mais atrapalha do que ajuda". Pondera que traz questões positivas e consolida diversas discussões existentes entre especialistas no assunto, como o regramento para processos transnacionais. Mas aponta, entre as questões polêmicas que tendem a não ser bem recebidas, a suspensão das garantias dos fiadores e avalistas quando o devedor entra em recuperação.
Outro ponto controverso é a permissão para que produtores rurais peçam recuperação judicial. Também adverte que a previsão de escolha de uma mediação prévia entre devedor e credores, com suspensão da execução, pode ter efeito contrário ao desejado: gerar uma corrida ao Poder Judiciário em busca de negociação para garantir proteção contra credores, quando o objetivo é negociar extrajudicialmente.
AS PRINCIPAIS MUDANÇAS
Dívidas trabalhistas: permite a inclusão dos pagamentos aos trabalhadores, desde que seja aprovada em negociação coletiva com o sindicato ou a categoria.
Dívidas com a União: amplia de 84 para 120 parcelas a renegociação de pendências com a União em caso de recuperação judicial. Também permite quitar até 30% da dívida consolidada e parcelar o restante em até 84 vezes. Nesse caso, a empresa pode usar 25% do prejuízo fiscal e partes menores da base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
Plano de credores: na tentativa de resolver impasses prolongados, quando o plano de recuperação da empresa é rejeitado, a lei permite que os credores apresentem sua proposta, que deverá ter apoio dos que representam mais de 25% da dívida para ser submetida à assembleia.