O Rio Grande do Sul registrou aumento no número de empresas que tentam recuperação judicial nos primeiros cinco meses deste ano, se comparado ao mesmo período do ano passado. De janeiro a maio, 45 companhias solicitaram auxílio de tribunais para tentar reequilibrar as contas. Em igual intervalo de 2019, esse número ficou em 39, segundo dados da Serasa Experian. Ou seja, alta de 15,38%.
Mas especialistas avaliam que esse cenário ainda não reflete o impacto da pandemia de coronavírus na economia gaúcha, que deverá ser sentido a partir do segundo semestre. Colocando uma lupa sobre os dados do Estado, o detalhamento mês a mês corrobora com o entendimento de represamento. Janeiro desponta como o de maior número de pedidos neste ano, totalizando 23. Abril e maio, quando a pandemia de coronavírus já atingia o país, somam apenas 10 requerimentos. A recuperação judicial é uma opção jurídica para empresas evitarem a falência, garantindo a possibilidade de renegociação de dívidas, mantendo a operação e, consequentemente, empregos.
A economista Maria Carolina Gullo, professora da Universidade de Caxias do Sul (UCS), afirma que esse resultado ainda reflete os efeitos da crise de 2015-2016, pois o país esperava uma retomada da economia com mais fôlego nos anos seguintes:
– Achava-se que 2018 e 2019 seriam os anos nos quais a gente iria se recuperar e compensar aqueles dois anos de perdas, mas muitas empresas não conseguiram dar a volta, não conseguiram recuperar os patamares anteriores e ainda sofreram concorrência dos importados, dependendo do segmento.
Maria Carolina diz que esse balanço não permite a avaliação por setor, mas estima que as pequenas e médias empresas, principalmente do segmento de bens de capital, estão entre as mais afetadas.
Estigma
Com resultado inverso, o número de pedidos de falência caiu de 20, nos cinco primeiros meses de 2019, para apenas um no mesmo período deste ano. O advogado especialista em recuperação judicial Eduardo Schumacher, sócio da Demóstenes Pinto Advogados, avalia que esse movimento é de certa forma natural, pois a falência é um processo mais complexo no país e deixa estigma no empresário que recorre a essa ferramenta.
Schumacher afirma que a elevação nos pedidos de recuperação judicial no Estado no período ocorre dentro de uma normalidade e que o crescimento maior deve ocorrer na segunda metade do ano. Segundo o especialista, muitos negócios estão conseguindo se manter em razão de reservas financeiras e de linhas de crédito emergenciais:
– Essas empresas estão alicerçadas nesses recursos, que são um pouco do caixa e crédito de terceiros. Se permanecer essa crise, a barragem não vai mais segurar. O que vamos ter? Vai rachar a represa e essa enxurrada de recuperações judiciais vai vir muito forte no segundo semestre.
Professor da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Marcelo Portugal também avalia que esses pedidos podem estar represados momentaneamente. Segundo ele, a longevidade dos efeitos vai depender da duração da crise atual.
– Boa parte da economia gaúcha que foi fechada pelas decisões do governo do Estado e, aqui em Porto Alegre, do município está cambaleante. Não caiu ainda. As pessoas estão tentando manter as empresas de pé na expectativa de que essa quarentena da economia não vai ser muito longa – diz.
O professor destaca que empresas mais saudáveis, capitalizadas, com pouco estoque e destreza nos meios digitais sairão na frente na reabertura das atividades econômicas, garantindo maiores chances de sobrevivência.
No Brasil, estabilidade e alívio temporário
O número de pedidos de recuperação judicial no Brasil se manteve praticamente estável nos primeiros cinco meses deste ano ante igual período de 2019. Recuou de 474 para 471, redução de 0,63%. Nas falências requeridas, a queda foi maior, retraindo de 580, em 2019, para 395 em 2020, ou seja, -31,89%. O economista da Serasa Experian Luiz Rabi diz que esse resultado surpreende em um momento de crise, mas também é explicado pelas manobras de socorro aos empresários:
– O que tem represado, segurado essa estatística, não só essa, mas a de inadimplência também, é o fato de que foi proporcionado para as empresas uma série de iniciativas em linhas de crédito e até mesmo processo de negociação voluntária por parte dos bancos das dívidas de seus devedores.
Rabi destaca que esse socorro emergencial tem prazo de validade e não vai durar muito tempo se não houver uma reabertura da economia.
– Por mais esforços, linhas de crédito que possam ser disponibilizadas, se a receita não aparece, é uma questão de tempo. Mais cedo ou mais tarde, as empresas vão estar pedindo falência, recuperação judicial e ficando inadimplentes. Por enquanto, houve essa mitigação temporária – pontua Rabi.