O aumento de dois dígitos nos pedidos de seguro-desemprego, impulsionados principalmente pela crise do coronavírus, está fazendo o ministro Paulo Guedes (Economia) estudar como obter mais recursos para o benefício.
Depois de pedir crédito a agências internacionais, ele agora planeja usar uma folga criada no cálculo do teto de gastos.
O impacto da pandemia no mercado de trabalho já levou 3,9 milhões de pessoas a pedirem seguro-desemprego ao governo no primeiro semestre, o que representa um aumento de 14,8% na comparação com igual período do ano passado.
Só em junho, o crescimento foi de 28% contra o mesmo mês de 2019 (para 653 mil).
Para bancar o aumento nos pedidos, o Ministério da Economia busca em agências internacionais um financiamento de US$ 780 milhões para o programa.
Entre as instituições, estão o NDB (Novo Banco de Desenvolvimento, o banco dos Brics) e o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento).
Nas contas do governo, o financiamento pode bancar cerca de 1 milhão de novos beneficiários. Isso cobriria de forma aproximada o saldo líquido de 1,1 milhão de vagas formais fechadas de janeiro a maio, de acordo com os mais recentes dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados).
Porém, o comportamento do mercado de trabalho ainda é incerto nos próximos meses.
Os números podem continuar se agravando em relação ao ano anterior, inclusive porque economistas consideram que há uma defasagem de tempo entre as demissões e os pedidos do seguro (que podem ser feitos em até quatro meses).
O secretário de Previdência e Trabalho, Bruno Bianco, disse que os dados do Caged do último mês sinalizam um abrandamento da crise, mas ressaltou não haver uma estimativa de quando o mercado de trabalho vai parar de fechar vagas.
— É muito difícil dizer, todos estamos enfrentando esse tipo de crise pela primeira vez —afirmou em entrevista sobre os dados há menos de duas semanas.
Outra pressão é a proposta de sindicatos para que mais duas parcelas do seguro sejam pagas a quem for demitido durante a crise do coronavírus.
A ideia foi apresentada ao Codefat (Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador), mas ainda não há previsão para ser analisada. A medida valeria para quem for demitido sem justa causa ou que esteja recebendo o seguro-desemprego.
Segundo representantes dos trabalhadores, o custo seria de mais R$ 16,1 bilhões neste ano.
— Mesmo com o início da reabertura de algumas atividades, quem ficar desempregado agora encontrará um mercado de trabalho ainda longe do que pode ser considerado normal — disse o representante da Força Sindical no Codefat, Sérgio Luiz Leite.
Diante da perspectiva de aumento, Guedes tem estudado mais alternativas. Uma delas é usar um espaço surgido no cálculo do teto de gastos nos últimos meses.
A folga apareceu com as primeiras medidas de enfrentamento do coronavírus, quando o ministro abriu os chamados créditos extraordinários para mitigar os efeitos da pandemia.
O instrumento pode ser usado para despesas urgentes e imprevisíveis (como em caso de guerra, comoção interna ou calamidade pública), e não conta no cálculo do teto.
Ao abrir os primeiros créditos, Guedes cancelou outras despesas previstas.
O objetivo era evitar pressões sobre normas fiscais como a regra de ouro (que impede endividamento para despesas correntes) e sobre a própria dívida pública.
Posteriormente, diferentes normas fiscais foram suspensas (por Congresso e Supremo Tribunal Federal) para enfrentar a situação de calamidade, o que dispensou a necessidade de cancelamento para créditos extras.
Mesmo assim, Guedes já tinha cancelado R$ 7,8 bilhões em despesas. Agora, o ministro planeja usar esse espaço, e parte pode ser destinada à demanda do seguro-desemprego.
Internamente, a equipe econômica não vê problemas legais para o uso da folga no teto. No entanto, Guedes avalia a possibilidade de pedir respaldo dos ministros do TCU (Tribunal de Contas da União) antes de tomar uma decisão.
O seguro-desemprego é custeado pelo FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), que tem como fonte principal os recursos das contribuições do PIS e Pasep, recolhidas pelos empregadores sobre o faturamento das empresas.
Dos R$ 40,5 bilhões reservados no Orçamento (elaborado ainda no ano passado) para pagar seguro-desemprego, cerca de metade já foi desembolsada, segundo consulta feita neste mês.
Em meados de maio, no relatório bimestral de receitas e despesas, o governo calculou a necessidade de um gasto extra de R$ 3,7 bilhões para custear novos pedidos de seguro-desemprego no país.
Os dados podiam estar abaixo da realidade no início da pandemia considerando o fato de agências terem sido fechadas por causa das restrições de circulação das pessoas. Somente a partir de abril foram liberadas solicitações pela internet e, em junho, 67% dos pedidos foram feitos online.
Dados do Ministério da Economia mostram que, em junho, a taxa de novos segurados ficou em 85% do número de solicitantes.
Dentre os pedidos negados até março, a principal causa foi não ter número de meses ou salários suficientes para entrar no programa (50,9% das negativas).
Tem direito ao auxílio quem foi demitido sem justa causa e não tem renda para se sustentar. É preciso ter trabalhado de 6 a 12 meses antes da dispensa (dependendo de quantas vezes já pediu o seguro).
Apesar dos custos, o seguro-desemprego é citado dentro da equipe econômica como um programa fundamental na resposta à crise econômica para proteger trabalhadores formais que forem demitidos. Há expectativa de que o número de pedidos continue a ser expressivo por causa da crise.