Presidente do Banrisul, Claudio Coutinho representa um dos segmentos mais cobrados durante a pandemia de coronavírus. O crédito não flui, e os bancos se justificam pelo chamado "empoçamento" dos recursos, uma referência ao fato de que o Banco Central dá liquidez, mas em vez de fluir até a ponta, o recurso se acumula nas instituições financeiras.
Coutinho aponta "incompreensão" sobre o papel dos bancos, tem rotina que lembra o filme Feitiço do Tempo, e aponta entre as lições da crise a necessidade de aprender com o que deu certo e a nova velocidade no trabalho.
Isolamento
"Estou em home office desde o final de março. E tenho trabalhado muito, bem mais do que se estivesse no banco. Para garantir a prestação de serviços aos clientes, que o aplicativo vai funcionar, que a linha de crédito estará disponível, é tudo para ontem. Tem sido intenso. Trabalho o tempo todo, inclusive nos finais de semana. O resultado é que parece que estamos presos no dia da marmota, como no filme aquele (Feitiço do Tempo, de 1993, em que o personagem principal revive sempre o mesmo dia, em que se observa uma marmota para prever a duração do inverno). Senta na mesma cadeira, passa o dia na frente do computador, de noite faz uma pizza ou um macarrão e cai duro."
Atividade física
"Consigo dar umas corridinhas de vez em quando, mas fora isso, nada. Não dá tempo. Chego no final do dia exausto. Termina por volta de 19h, 19h30min, já no bagaço. Só quero uma compensação para o dia: uma taça de vinho e macarrão. No fina de semana, é que dá para ler um pouquinho."
Lives
"Tenho feito algumas, mas também distribuo entre os executivos do banco, até para não ficar só eu falando. Diretores, superintendentes ajudam a diversificar a cara do banco, que também é feito de seus profissionais. Participo quando é estratégico para o negócio, às vezes também é importante esclarecer alguns pontos. O Banrisul é o banco dos gaúchos, logo cada gaúcho se sente dono, e tenho de prestar contas a eles. Também participo, falando ou para assistir, de livre da PUC-Rio ou da FGV, que permitem atualizações em várias visões."
Leituras e lições
"Leio muitas coisa na internet sobre a situação atual. Fora isso, gosto muito de ler assunto históricos. O mundo real suplanta de longe a ficção. Ganhei um livro, que estou lendo aos pedaços, chamado Parceiros Improváveis (de Julian Gewirtzg, 416 páginas, editora Alta Books), que conta como a China deixou de ser um país agrário falido para se tornar, ao menos na economia, uma potência capitalista. Eles foram buscar economistas americanos para fazer seminários e mostrar o caminho para o desenvolvimento. Isso faz parte da origem dos chineses, e pode ser uma lição para nós: aprender com o que deu certo. Fiquei espantado, sempre imaginei que havia sido uma construção 100% chinesa. Então, uma das maiores lições veio desse livro. A gente quer ficar com o orgulho de ter encontrado a solução, quer fazer do nosso jeito, e muitas vezes o melhor é aprender com o acerto dos outros."
Reflexões
"Existe uma incompreensão muito grande do papel dos bancos. Temos entregue estabilidade, serviços, facilidades. Estamos em uma crise horrorosa e do ponto de vista financeiro, está tudo funcionando, as pessoas estão aplicando recursos, sacando dinheiro. As pessoas acham que isso é 'take for granted', como se fosse parte da natureza que seja assim. É preciso trabalhar duro para que isso aconteça. Mesmo em relação ao crédito, ao empoçamento. Os bancos têm papel de reciclar capital, fazer a intermediação entre o aplicador e o tomador. E o crédito tem de ser responsável. O banco não pode fazer doações, quando não tem a menor certeza de que os tomadores vão conseguir pagar a dívida. A gente apanha mesmo quando está cumprindo nossa missão. Faz parte, vamos adiante."
Aprendizado
"Dá para fazer tudo muito mais rápido do que as pessoas dizem. Sem covid, iam dizer que o que fizemos não dava para fazer. No susto, colocamos 7 mil pessoas trabalhando em home office. Se fosse um programa voluntário, umas 10 pessoas iam dizer que daria problema. Quando precisa fazer, faz. A velocidade das coisas, depois da pandemia, vai continuar maior. Aprendemos a mudar de forma muito rápida."