Enquanto o Brasil tenta acelerar o processo para adoção da tecnologia de telefonia móvel de quinta geração, a 5G, crescem as pressões sobre qual fornecedor escolher. A guerra travada pelos Estados Unidos contra a Huawei, acusada de espionagem pelo governo americano, vai colocar o Planalto diante de um dilema. Caso queira manter o clima de cooperação anunciado pelo novo embaixador em Washington, terá de desagradar a seu maior parceiro comercial, a China, agora envolvido na operação de guerra contra o coronavírus.
No embate pela escolha do fornecedor da tecnologia, os Estados Unidos sinalizam que, se o Brasil adotar a Huawei, pode comprometer um dos pontos do acordo desenhado no primeiro encontro oficial entre os presidentes Jair Bolsonaro e Donald Trump: a parceria em pesquisa e desenvolvimento (P&D) na área de defesa que se seguiria ao reconhecimento do Brasil como aliado preferencial extra-Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). O acordo estaria quase concluído, pronto para ser anunciado em duas semanas, pouco antes ou durante a viagem que Bolsonaro quer usar também para tentar atrair uma unidade da Tesla para o Brasil.
Para dificultar a renúncia a essa filé – a parceria em P&D, não a Tesla –, os americanos acenam com seu orçamento de US$ 750 bilhões na área de defesa, dos quais 15% são em P&D. Como em todo processo complexo, tratam de apresentar uma lógica simples: se vão confiar segredos na área de defesa ao Brasil, precisam ter segurança de que serão protegidos de outros parceiros com intenções escusas. E como toda lógica simples demais, fica longe da verdade. Em primeiro lugar, não há hipótese real de que os EUA compartilhem com o Brasil efetivos segredos militares. Em segundo, a parceira com o Brasil, por mais robusta que seja, representaria uma migalha do orçamento militar global.
Sem uma empresa com domínio da tecnologia 5G para chamar de sua, os EUA usam essa fragilidade como fortaleza. Ponderam que não exigem a contratação de uma fornecedora americana. Apontam as alternativas escandinavas, Nokia e Ericsson, como prova de que só querem evitar a associação do parceiro estratégico a uma empresa opaca como a Huawei, que não tem ações listadas em bolsas de valores nem controladores conhecidos.
No início deste mês, porém, o procurador-geral de Justiça dos EUA, Bill Barr, propôs que o controle da sueca Ericsson e da finlandesa Nokia seja assumido por americanos, "seja diretamente, seja por meio de um consórcio de empresas privadas americanas e aliadas". O jogo é pesado, ainda para um governo que vem se notabilizando pela falta de tato no tratamento de assuntos sensíveis. Quem terá de arcar com os custos de uma decisão errada não será um time de plantão por quatro ou oito anos, mas os cidadãos pelo resto de seu futuro.