Os sinais dos técnicos e dos parlamentares ligados ao governo Bolsonaro eram de que a aprovação da reforma da Previdência na Câmara dos Deputados seria um passeio. A arrancada, na tarde de ontem, não correspondeu às projeções. A oposição, que até agora vinha fazendo barulho com pouco eco, não abdicou de seu escasso poder, o de atrasar a votação. Estrago maior, outra vez, partiu exatamente de onde mais se temia: do presidente da República e de seu entorno.
Jair Bolsonaro voltou a defender tratamento ainda mais privilegiado às forças policiais, já contempladas com idade mínima de 55 anos, enquanto a dos trabalhadores “comuns” aumentará para 65, ou seja, uma década a mais. No discurso do presidente, “é justo o reclame deles”. Confrontado com o risco de beneficiar uma categoria já tratada com boa vontade, para dizer o mínimo, sustentou que a classe “nunca teve privilégio”. O resultado é que outro partido, agora o Podemos – antes havia sido o PSL –, animou-se a patrocinar emenda que reduza ainda mais a idade mínima em plenário.
Em troca de redução de gastos estimada em R$ 1,16 trilhão em 10 anos – o secretário especial da Previdência e do Trabalho, Rogério Marinho, prefere contabilizar também a poupança que a MP 871, que combate fraudes no Regime Geral –, o governo já havia aceito “pagar” emendas parlamentares que estão fora do orçamento, cujo valor é estimado em R$ 5 bilhões. Certo, é menos de 5% do valor que será poupado com as mudanças nas regras de aposentadoria, mas declarações como as que Bolsonaro têm repetido desde o final da semana passada, caso ganhem padrinhos no plenário da Câmara, podem diminuir o custo/benefício da reforma, reduzindo o que deixará de ser pago no futuro.
Para garantir um número vistoso, foi embutido até aumento de tributo no cálculo, como reconheceu Marinho em sua passagem por Porto Alegre na sexta-feira passada.
– Se houver concessão, que seja mínima – disse o secretário.
Será preciso defender a estabilidade fiscal nas madrugadas de Brasília.