A dor do primeiro bate-cabeça público do governo Bolsonaro, no terceiro dia útil do novo governo, ainda não passou e já surgiu uma nova. Nesta segunda-feira (7), foi a vez de a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, afirmar que o presidente "tem se posicionado a favor de fazer o perdão" das dívidas do Funrural, o que espetaria uma conta extra estimada em R$ 18 bilhões no rombo público que Paulo Guedes e seus Chicago Oldies – a expressão foi chancelada pelo próprio Guedes, na solenidade de transmissão de cargo –querem estancar.
Minutos depois da manifestação da ministra à Rádio Gaúcha, dois dos Chicago Oldies (o apelido faz referência ao pensamento liberal dos recém-formados
pela Universidade de Chicago, adaptado ao fato de que os convidados por Guedes terem passado por lá há certo tempo) tomaram posse em seus cargos em bancos públicos. O mais notável é Joaquim Levy, na presidência do BNDES, mas até pela sensibilidade ao tema de Tereza Cristina, é tão importante quanto a chegada de Rubem Novaes, PhD em Economia por Chicago, ao Banco do Brasil. É a instituição que opera crédito rural no país e, portanto, tem parte em um eventual "perdão" de dívidas.
Em um ministério tão eclético quanto o de Bolsonaro, que abriga ao menos quatro núcleos (liberal, militar, evangélico e fundamentalista), divergências e batidas de cabeça eram esperadas. No entanto, começaram antes e representam mais riscos do que se temia. O mercado financeiro, por exemplo, sempre trabalhou com a hipótese de que Paulo Guedes teria o leme da política econômica e nada desviaria seu barco. Não tem ocorrido assim.
Tanto o episódio de sexta-feira, de manutenção de subsídio seguido de elevação de imposto, quanto o desta segunda-feira, de aumento não previsto de despesa pública, têm o mesmo objetivo: não contrariar interesses de bancadas importantes para que o governo possa aprovar a reforma da Previdência. Se continuarem nessa proporção, porém, podem custar a credibilidade do governo em relação à austeridade fiscal.
Nas versões desconexas sobre o que ocorreu na sexta-feira, surgiu até uma versão de que
ele teria aprovado o aumento de IOF anunciado por Bolsonaro e depois desmentido.
É difícil imaginar a cena: o economista que passou as três últimas décadas esbravejando contra o tamanho da carga tributária e que anunciou, no discurso oficial, a intenção de levá-la dos atuais cerca de 36% do PIB (na definição de Guedes) para 20% dizendo algo como "vamos aumentar, é só uma fração". Os presidentes dos bancos públicos acenam com uma severa redução do papel e do tamanho dessas instituições. Talvez seja a única forma de conter o apetite dos próprios colegas.