Quando Carlos Wizard Martins vendeu seu Grupo Multi por quase R$ 2 bilhões, em 2013, na antessala da crise, a expectativa era de que havia feito outro grande negócio: livrar-se do risco Brasil na dura fase de recessão. Que nada. Assim como surpreendeu se desfazendo das redes de ensino que criou ao longo de décadas, causou espanto a série de aquisições que se seguiu. O empresário que incorporou o nome de uma de suas escolas de inglês — passou a assinar Wizard em 1989, por sugestão de uma franqueada —, explicou à coluna, confusa com tamanha diversidade: sua especialidade é criar sólidas redes de franquias, não importa o segmento. Martins esteve em Porto Alegre na semana passada, dando uma aula no curso de Gestão, Empreendedorismo e Marketing da PUCRS.
O que o moveu a reinvestir boa parte da fortuna amealhada com a venda?
Todo empreendedor é um sonhador. Depois que realizamos um grande sonho, descobrimos que há sonhos ainda maiores a serem realizados. Muita gente me perguntou se ia me aposentar, passar a vida descansando, viajando. Quando se faz o que gosta, trabalho não é trabalho, é realização, contribuição, satisfação. Quando a pessoa atinge certo nível de conforto financeiro, tem o sentimento de deixar um legado. É o que me motiva hoje, auxiliar a formar novos empreendedores de forma a ajudar a diminuir a distância entre onde estão e o objetivo que querem alcançar.
Quando você começou, encontrou algum tipo de apoio?
Nos anos de faculdade, pensava sobre projetos de futuro. Passei a ler livros sobre liderança, empreendedorismo, como formar equipes, como ter expansão do negócio. Esses livros me inspiraram para empreender, mais tarde. Isso me motiva a escrever livros. Sou autor de dois livros e, neste ano, lancei Do Zero ao Milhão.
É uma boa tradução de sua trajetória?
Representa bem essa transformação, do indivíduo que sai literalmente do zero e atinge uma condição de realização.
Como foi começar do zero?
Houve alguns aspectos que auxiliaram. O fato de ter morado nos Estados Unidos por cinco anos foi uma influência forte. Tive contato direto com a cultura de empreendedorismo. O segundo aspecto é ter formado o que chamo de biblioteca do sucesso. Com os livro que lia, fazia um quebra-cabeça, ia montando meu próprio mapa de preparação mental e emocional. O terceiro é ser uma pessoa muito movida pela fé. Essa inspiração, a sabedoria que vem pela fé sempre me deu uma força muito grande, autoconfiança, e acima de tudo deu norte, direção. Foram esses elementos que me auxiliaram a sair do zero, apesar de na época não haver Sebrae, estrutura de apoio e outros mecanismos que o jovem hoje tem.
E o que explica a diversidade de seus negócios atuais?
Essa é uma pergunta recorrente. Na realidade, minha especialidade, minha competência é expandir o negócio pelo sistema de franquia, independentemente se estou vendendo comida mexicana, com Taco Bell, curso de inglês, com Wise Up, ou produtos naturais, com Aloha. Minha competência é ter um modelo de negócios que vai trazer maior número de parceiros, que vou treinar, orientar, motivar, estabelecer metas, acompanhar resultados, reconhecer e premiar no final. Então se estou vendendo escola de futebol com Ronaldo e Neymar, se estou vendendo um produto natural no Mundo Verde não faz muita diferença. O importante é o relacionamento com o parceiro de negócios.
Há foco em vender franquias?
Franquias e o projeto Aloha, lançado neste ano, de vendas diretas. No primeiro ano, vamos fechar com 10 mil consultoras, num projeto que chamo de empreendedorismo social. Para montar uma loja da Taco Bell, precisa de R$ 2 milhões, uma do Mundo Verde custa R$ 500 mil, uma Wise Up, R$ 200 mil, uma escola de futebol, R$ 100 mil. Muita gente não tem R$ 1 milhão ou R$ 200 mil, mas tem R$ 1 mil ou R$ 2 mil no bolso. Aceito esse pequeno empreendedor e dou todas as condições de crescer no projeto Aloha. Lançamos em julho e já estamos com 4 mil consultoras em nível nacional.
É uma ousadia competir com gigantes como a Natura?
Na verdade, não considero nenhuma empresa existente como concorrente, e a Natura certamente é a maior. Vejo como objetivo a alcançar. Nosso objetivo é nos próximos 10 anos atingir 1 milhão de consultoras Aloha. Significa dizer que vamos ser tão gigantes quanto a Natura é gigante hoje. É só uma questão de tempo.
Ao dizer que a Aloha é um projeto de empreendedorismo social significa que é para uma faixa de renda mais baixa?
Não, só é uma porta de entrada mais acessível. A qualidade dos produtos oferecidos atende a todas as classes de consumidores.
Como se mantém disposição para empreender em um ambiente de negócios hostil?
Temos dois países. Tem o Brasil da pobreza, da tristeza, da desgraça, da miséria, da carência. E tem o Brasil da riqueza, do desenvolvimento, da fortuna, das oportunidades. Tanto é que temos hoje temos hoje 30 novos milionários por dia no Brasil. Trinta hoje, amanhã mais 30. Isso não acontece na Argentina, no Chile, no México. As pessoas não sabem porque notícia boa não vende jornal, não chama público, não gera audiência de TV e sites de notícia. Você abre sites e só vê notícia negativa, desastre, corrupção. Mas se você tiver capacidade mental de se direcionar para o Brasil que dá certo, tem muitas oportunidades para muita gente ficar bem de vida no Brasil.
Para chegar a esse Brasil da riqueza e da oportunidade, não precisa passar pela burocracia, pela política torta?
Sinceramente, não controlo o que se passa na cabeça do presidente desse país. Não consigo controlar o Congresso, o Senado, os desdobramentos da Lava-Jato. Mas consigo controlar o meu negócio, a qualidade de atendimento do meu cliente, minha linha produtos, a limpeza da minha loja, a condição de tratar bem o cliente, atender a sua expectativa. Consigo controlar minha planilha de custos, o grau de treinamento e capacitação para o colaborador. Em vez de focar no incontrolável, opto por focar minha energia no que consigo controlar, influenciar ou prever o resultado. É assim que lido com essa situação difícil do Brasil Estamos enfrentando uma crise política, não econômica. Tão logo seja superada, o Brasil volta a crescer, prosperar, os investidores estrangeiros voltam para o país.
Enquanto não é superada, como você vê a economia nos próximos anos?
O Brasil historicamente sempre teve uma economia cíclica. Nem sempre estamos no topo do sucesso, nem sempre no fundo do abismo. Por mais difíceis que tenham sido os últimos anos, pela primeira vez começamos a notar uma reação da economia, o emprego volta a acenar com cenário positivo, a indústria volta a ter pequena previsão de crescimento. E não podemos ignorar que 2018 é ano de eleições. Historicamente, isso faz a economia rodar, vai gerar oportunidades. Então, 2018 é um ano que promete.
E depois?
Só vamos saber no final das eleições. Ou vamos ter uma perspectiva muito positiva ou vamos amargar mais alguns anos até que que a política entre no patamar esperado pela população.