Uma guerra cambial – ao menos por ora – entre Estados Unidos e Europa abriu a temporada de especulações sobre quando a cotação do dólar no Brasil vai cruzar a fronteira de R$ 3,10. As apostas chegaram a se concentrar nesta terça-feira, mas uma fala do presidente do Banco Central (BC), Ilan Goldfajn, ajudou a adiar a data. Não por muito tempo.
Donald Trump havia afirmado que o dólar estava "muito forte" ao The Wall Street Journal, em 17 de janeiro. Nesta terça-feira, o diretor do Conselho Nacional do Comércio dos EUA, Peter Navarro, reforçou a munição a outra publicação influente na economia, o britânico Financial Times. Navarro acusou a Alemanha de se aproveitar de um euro "fortemente desvalorizado".
Em jogo, está a exportação. Com dólar forte, diminuem as chances de os produtos americanos no mercado externo, que ficam mais caros. Com euro subvalorizado, os 17 países que compartilham a moeda vendem mais barato e, consequentemente, mais.
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Da guerra cambial à verbal, poucas palavras. E entre Donalds: o Tusk, presidente do Conselho Europeu, espécie de representação coletiva do bloco, definiu Trump como "ameaça externa", como Rússia e China.
André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos, avalia que a quebra do piso é questão de dias. Nesta terça-feira, a menção de Ilan à possibilidade de o BC aproveitar o momento de baixa para reduzir o estoque de contratos que equivalem à venda de dólares provocou um repique no final do dia, com operadores tentando se antecipar à oferta. No entanto, Perfeito avisa que não muda a projeção de cotação para o final de ano, de R$ 3,60, acima da média do mercado.
Na avaliação do economista, o principal acelerador deve ser a turbulência provocada pelos desdobramentos das delações da Odebrecht. Em prazo mais longo, observa Gustavo Candiota, diretor da GC Prime Câmbio Inteligente, especulações de que o juro nos EUA não será elevado em 2017 favoreceram a baixa do dólar. Antes da divulgação do PIB dos EUA abaixo do esperado em 2016, de 1,6%, havia expectativa de até três altas.
No mesmo dia em que Ilan deu um raro sinal cambial, passou um recado sobre sua ambição na presidência do BC: no longo prazo, quer fixar meta de inflação em 3% ao ano, como ocorre na média dos países emergentes. Pelo jeito, não teme eventuais efeitos de delações no câmbio e na inflação.