A coluna já havia mencionado o climão em Brasília, sem relação com a Operação Lava-Jato. Quando o ministro da Fazenda tem de defender decisões do governo criticadas por especialistas em contas públicas, como fez Henrique Meirelles pela segunda vez nesta quarta-feira, em momento tão delicado da economia brasileira, eleva o sinal de alerta. Diante do desconforto provocado por concessões do governo federal a parcelas do funcionalismo público – como de hábito, as de maior poder de “convencimento” –, Meirelles, o fiador da nova política econômica, tenta apagar a má impressão, outra vez.
Vai ter trabalho dobrado, desta vez. No episódio do aumento para servidores do Judiciário, entre outras categorias melhor remuneradas, o governo interino encontrou respaldo entre economistas para a tese de que o acordo havia sido economicamente defensável, por representar reajuste até abaixo da inflação no período negociado.Desta vez, faltou coro a favor e sobrou contra a manobra que retira as verbas indenizatórias e outros benefícios do Judiciário e do Ministério Público do cálculo do limite de gastos com pessoal dos Estados, contrapartida à renegociação da dívida. Tanto que se fala, em Brasíla, do “recuo do recuo”, por mais que Meirelles insista que não voltou atrás.
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Um dos criadores da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), Luiz Roberto Afonso, considerou “lamentável” o fato de dois poderes tentarem ficar imunes ao controle de gastos. Outro especialista em contas públicas, Marcos Lisboa, lembrou que a despesa com pessoal foi o item que mais subiu no orçamento federal nos últimos seis anos. Em um momento em que o governo interino ainda precisa se legitimar e, acima de tudo, marcar diferença em relação à política econômica que levou o Brasil a uma das mais duras recessões de sua história, essa concessão pode sair caro. Tanto para os contribuintes quanto para quem assim decidiu.
Mais do que a média dos brasileiros, os gaúchos sabem onde leva a perda do controle dos gastos com pessoal. Para os Estados, ter um limite imposto pela União também seria uma forma de reduzir os conflitos entre poderes no nível local.O preço da concessão fica mais claro quando, ao mesmo tempo em que nega o recuo, Meirelles admite pela enésima vez que aumento de impostos não está fora de cenário – e deve ser definido até o final do mês. É o prazo legal para envio do orçamento da União de 2017 ao Congresso. Se a alta de tributos mais anunciada do país nos últimos anos se confirmar, o custo da benesse estará incluído.