Desde o início, a teoria da conspiração que cobria de suspeitas as urnas eletrônicas se mostrava uma cortina de fumaça para desrespeitar eventuais resultados negativos. Nem era preciso traquejo tecnológico para identificar a manobra. Bastava se questionar como seria possível que legiões de juízes e promotores em todas as unidades da federação, incontáveis técnicos, representantes de partidos e levas de jornalistas atrás de uma boa denúncia consentissem com a trama eleitoral?
Pois soube-se há alguns dias, com a revelação dos depoimentos prestados à Polícia Federal sobre a tentativa de golpe em 2022, que o próprio presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, não acreditava nas suspeitas contra as urnas levantadas pelo Instituto Voto Legal, que recebeu R$ 1 milhão do partido. O presidente da legenda afirma agora que “nunca foi apresentado nada consistente” sobre supostas fraudes. Idem, repetem os ex-comandantes militares que viram as Forças Armadas emprestadas às teses do ex-presidente Bolsonaro, numa metódica desmontagem da teoria da conspiração.
Ou seja, por uma falácia jamais comprovada vivemos uma crise institucional que incentivou milhares de pessoas a se atracarem por meses a muros de quarteis. Nada menos que 1.430 foram presos por terem vandalizado as sedes dos três poderes e muitos pagarão alto por acreditarem cegamente em uma invencionice destinada a amparar um projeto de continuidade no poder a qualquer custo.
Apesar das evidências, no mundo de hoje lógica e raciocínio fazem pouca diferença. O que vale é o que se chama de viés de confirmação. Alguém posta algo na internet e, por mais estapafúrdia que seja, a teoria vai contar com uma multidão de seguidores que já tinham sua convicção ou desconfiavam de algo do gênero, ou por não compreenderem o assunto ou por crença preexistente. Os negacionistas a pregar que a terra é plana são apenas a caricatura da tendência de se acreditar em sandices desde que apresentadas de forma convincente.
Vídeos e áudios falsos são armas particularmente eficazes. Nas eleições de Bangladesh no ano passado, uma montagem rudimentar mostrando uma candidata da oposição, Rumeen Farhana, usando bíquini causou indignação no eleitorado conservador de maioria muçulmana. “Eles acreditam em qualquer coisa que veem no Facebook”, desabafou a candidata, numa síntese destes novos tempos citada em reportagem da Associated Press.
Estelionatários aprimoram há séculos a arte de iludir incautos ao empregar a seu favor o viés de confirmação. Todo 171 sabe que sua presa é aquela que quer acreditar na parolagem, por mais mirabolante que seja. Salvam-se os que param por um segundo para conferir contos do vigário mais a fundo e questionar se naquele post não estão lhes servindo gato por lebre.