Como repórter, enveredei por quatro países de regime socialista nos quais não deveria haver mercado livre porque a economia, em tese, era dirigida pelo poder central. Mas nos quatro — Cuba, União Soviética, Venezuela e Iugoslávia — o mercado só não existia na narrativa dos governos. Na vida real, era uma rede paralela de empreendedores extraoficiais ou uma teia clandestina, abastecida por desvios de estatais e contrabando. Mesmo em regimes socialistas, o mercado, esse ente agora tão vilipendiado por Lula e seu entorno, cuida de prover aquilo que é desejado mas escasso em sociedades de economia controlada.
O mercado não está atrás de popularidade. Ele não é candidato, não tem CNPJ ou endereço e reage a rabugices com mais cara feia porque gosta de segurança e previsibilidade. O mercado, avise-se, somos todos nós, em cada transação econômica de cada cidadão a partir da milenar lei da oferta e da procura. Um exemplo simples. Muita gente deixou de viajar de avião na pandemia? Os preços das passagens caem. Todo mundo quer viajar agora? Os preços sobem. Querem controlar o preço dos bilhetes? Alguém vai pagar a conta. Quando as companhias aéreas são estatais, é o contribuinte. Quando são privadas, elas dão prejuízo e muitas quebram.
No Brasil de Lula, tem ministro que deseja povo na rua para forçar o Banco Central a reduzir os juros. Os "rentistas", essa espécie que virou alvo lulista, agradecem. A cada sandice que vem do governo, os juros futuros — ditados pelo mercado real e não pela cabeça dos governistas — sobem mais um tanto, e o dólar, que dá sinais de exaustão em quase todo o mundo, ganha oxigênio extra no Brasil.
O governo está dividido entre incendiários e bombeiros. De um lado, Gleisi Hoffmann, a blogosfera petista e o próprio Lula. Já Rui Costa, Alexandre Padilha e Geraldo Alckmin tentam apagar os incêndios. Fernando Haddad parece perplexo, mas ajudaria se ele apresentasse a Lula a experiência da Turquia. Lá, não há banco central autônomo e o presidente Recep Erdogan decidiu baixar os juros na marra. Demitiu a diretoria do banco e decretou a redução da taxa. Resultado: a lira turca está entre as moedas campeãs de desvalorização nos últimos dois anos. A inflação em novembro do ano passado chegou a 86% ao ano. O mercado é assim, queiram governos ou não.
Agora, a onda de uma esquerda fossilizada é atacar a autonomia do Banco Central. É perda de tempo. O juro está alto porque a inflação ainda tem muito fôlego no Brasil, em boa medida pela irresponsabilidade fiscal do governo. Inflação é o maior inimigo dos pobres, porque bate mais forte nos alimentos e eles não têm como proteger sua renda. Lula quer ajudar os mais pobres? Trabalhe para reduzir, de forma sustentada, a inflação e o déficit público. Os juros, e o mercado, virão atrás.