Li agora, em O Globo, que um farmacêutico no Wisconsin destruiu 500 doses da vacina para proteger pessoas de terem seu DNA modificado e de se tornarem inférteis. Ele foi preso pelo FBI. Ele acredita também em outras coisas: o céu não é real, mas uma película que nos impede de enxergar Deus; naturalmente, a Terra é plana.
De volta aos anos 1970: o Clube Militar lança nota apoiando o deputado truculento que foi preso em flagrante. Isso logo depois de mais um general ser nomeado para alto cargo executivo na Petrobras. Entre o momento em que escrevo e aquele em que este texto vai ser lido, é muito provável que mais coisas dessa ordem aconteçam.
Difícil manter a cabeça no lugar. Mas já que o prezado leitor, a gentil leitora estão aqui, ofereço um leniente, um calmante, um refrigério: a recomendação de conhecer, se ainda não chegaram lá, o podcast Noites Gregas. Está no Spotify e no Apple Podcasts. Não vai ajeitar as coisas no mundo imediato, mas vai ajudar a manter a saúde mental.
O trabalho tem como protagonista Cláudio Moreno, colaborador de GZH, professor de português, notório frequentador da tradição das histórias gregas (e latinas e árabes igualmente). No Noites Gregas, ele toma um mito, uma figura central e a apresenta, repassando relatos que dela ficaram, registrando variantes — a lindeza da mitologia está tanto na trama e nos caracteres, quanto no seu profundo entranhamento na cultura oral, variada como se sabe que é, e que veio sendo adensada até ganhar forma escrita. (A edição, do Filipe Speck, é também um trabalho de alto nível.)
O Moreno não interpreta, não quer decifrar significados pela psicologia ou pela sociologia: ele quer mesmo, sabiamente, é deixar as histórias reverberando na inteligência e na sensibilidade da audiência. E é lá, nesse fundo humano radical, que nos define como gente, que devemos nos fortalecer para manter a cabeça sobre os ombros.